msg 7 De: "Alberto Mesquita Filho" Data: 18/04/00 Belisário: Tentei entender seus argumentos,... Como sempre, por sinal, e fico muito agradecido por isso. Sinto que nosso diálogo está ganhando textura e as idéias estão se entrelaçando. Consequentemente, terei que modificar o enfoque e responder ao todo e não as partes, coisa que você já fez na msg anterior. Isso é muito bom pois revela que estamos realmente dialogando e não simplesmente trocando e/ou reformulando idéias vagas, o que também situa-se no terreno da dialética, ainda que de forma rudimentar. Vou iniciar reproduzindo um texto de Einstein que julgo fundamental para um diálogo produtivo. Não no sentido de orientar o diálogo pois pela sua "meia frase" citada acima percebe-se que você já está inserido no contexto deste pensamento sábio. Mas para que eu possa justificar, não para você mas, principalmente, para os demais participantes da ciencialist, a razão de meus erros que venho admitindo tê-los cometido, o que continuarei a fazer tão logo me convença de que a sua argumentação momentânea está me colocando, de alguma forma, em xeque. Alguns julgam que aprender pelo diálogo é convencer o "oponente" de que ele está errado. Não vou negar que trata-se de uma condição a nos satisfazer, mas em nada supera a alegria de aprender. E aprende-se muito mais com nossos erros do que com nossas virtudes. Alguns preferem aprender com o erro dos outros, e julgam-se sábios por isso; pois que é uma norma muito boa a ser observada no nosso dia-a-dia mas que nem sempre relaciona-se a ser criativo. E eu digo que a atividade criadora pressupõe o "aprender com seus próprios erros". O pensamento de Einstein é o seguinte (creio já tê-lo destacado mais de uma vez aqui na ciencialist): Se o senhor quer estudar em qualquer dos físicos teóricos os métodos que emprega, sugiro-lhe firmar-se neste princípio básico: não dê crédito algum ao que ele diz, mas julgue aquilo que produziu. Porque o criador tem esta característica: as produções de sua imaginação se impõem a ele, tão indispensáveis, tão naturais, que não pode considerá-las como imagem de espírito, mas as conhece como realidades evidentes. (Einstein, "Como Vejo o Mundo"). Como todo pensamento sábio, abre um leque de interpretações. Alguns acham que estou tentando induzi-los a que leiam meus outros artigos. Os que assim entenderam, também me ajudaram (parece-me ter sido o caso do Fábio Chalub) mas não era essa a minha intenção original. O que está em jogo neste diálogo, e de minha parte, são as afirmações que fiz na mensagem primeira e nas seguintes. Se algumas destas msgs levam a alguma coisa nova, é isto que espero seja levado em conta como "algo que produzi" e é isto que está em "julgamento". Os "produtos de minha imaginação" poderão ser contestados e admito que possam estar errados. Enquanto o diálogo durar, "o algo que produzi" (ou então, aquilo que os demais participantes porventura tenham produzido nas msgs resposta, pois com frequência surgem produções novas) ainda está implícito como hipótese aceitável, mesmo que não justificável pelas "imagens de espírito" a serem reformuladas (não se trata da introdução de hipóteses "ad hoc", pois sequer são hipóteses no sentido científico do termo). Se para justificar minhas idéias tiver que recorrer a "produtos de minha imaginação" expostos em outros artigos (e que, neste caso, podem ou não assumir condições de hipóteses acessórias e previamente aceitas em minha mente), cabe-me esclarecer o que estou pretendendo dizer, ainda que nada me impeça de citar a fonte bem como nada impedirá os demais, participantes ou leitores do debate, que a consultem. Sua colocação sobre o diálogo Einstein e Bohr vem a calhar e creio que seria interessante para todos os que estão acompanhando nosso diálogo o texto referido sobre o paradoxo EPR. Já estou convencido de que, se eu julgar que deva manter o texto numa segunda edição, terei que promover algumas modificações. No que diz respeito à teoria de Bell, uma das saídas, a meu ver, seria, quando muito, escrever algo do tipo: "A teoria de Bell, como tem sido interpretada com frequência (e aqui fazer algumas citações)...etc "; e a seguir acrescentaria o que se fizesse pertinente. Com efeito, a ênfase dada em meu texto à teoria de Bell em si está muito mais dirigida a contrapor-me a essa interpretação errônea que você aponta, o que viria a embotar qualquer raciocínio que viesse a utilizar a seguir, do que propriamente à "necessidade" em observar um erro de Bell para satisfazer meus argumentos. Por outro lado, se, como você afirma, a teoria de Bell tem outras inconsistências, o que obviamente poderá se propagar para a interpretação da experiência de Aspect, isto de alguma maneira interferirá com meus argumentos como um dado acessório, mas não creio que essencial. O quarto parágrafo de sua msg é bastante esclarecedor, pelo menos para mim. Aliás, acho que todo estudante de Mecânica Quântica deveria ler, num outro contexto, todas as afirmações expostas em sua msg e relativas à física quântica. A última frase deste parágrafo é bastante interessante: "Teríamos então que mostrar que o Princípio da Incerteza está contido na própria hipótese da existência de sistemas de dois níveis, o que me parece impossível." Qualquer impossibilidade é sempre preocupante, em especial se inerente a um princípio (a termodinâmica que o diga). E ainda mais se esta impossibilidade relacionar-se a um princípio que, por si só, compromete-se com outras impossibilidades. Mas esse é um outro assunto que pode ser deixado para uma outra vez. O importante é que me comprometi com essa idéia, talvez como uma "imagem de espírito" que teria se me mostrado como "realidade evidente". E eu me pergunto, ainda que aceitando como verdadeira a sua idéia de impossibilidade: O que sustentaria essa impossibilidade? Seria ela inerente à natureza? Seria ela inerente à física clássica? Seria ela inerente ao eletromagnetismo? Seria ela inerente à física moderna? Não estaríamos nós, e refiro-me à comunidade científica, aceitando como "realidade evidente" algo assimilado no passado e que nada mais seria que não mais do que uma "imagem de espírito"? Afinal, não estou a procura de erros porventura cometidos por Einstein, Bohr, Bell ou Aspect! Estou à procura da verdade! A minha verdade, sim; ou seja, a verdade que me satisfaz. Mas a verdade que me satisfaz não é realmente a minha verdade mas a nossa verdade, que é minha, é nossa e não é de ninguém. Ops!!! Vou parar um pouco senão isto aqui vira poesia. Até logo mais. Vou reler o meu texto bem como sua msg. Voltei!!! Interessante a sua colocação sobre os diferentes posicionamentos de Einstein e Bohm. Diferentes porém interelacionados. Lembro-me de Bohm (ou, quem sabe, algum outro autor) ter escrito em algum lugar que sua idéia teria surgido de uma conversa com Einstein. E, com efeito, Einstein preocupava-se com uma explicação lógica para determinados efeitos ou, como você se refere, um refinamento da Teoria Quântica. A preocupação de Einstein, a meu ver, estava muito mais voltada à procura por uma teoria de campo consistente (talvez a unificar fenômenos quânticos à sua relatividade - a teoria do campo unificado) do que a explorar a existência de "algo" que estivesse faltando, uma peça perdida de um quebra-cabeças. É muito difícil saber o que se passava pela cabeça de Einstein, pois suas "imagens de espírito", nesta fase de sua vida, eram muito sofisticadas, como que, diria, de segunda ou terceira geração e relacionadas àquelas que teria transformado em "realidades evidentes" (teoria da relatividade, explicação do efeito fotoelétrico, etc). Não creio ser impossível que ele viesse a aceitar a idéia das variáveis escondidas (talvez não no mesmo sentido de Bohm), porém também não acredito que tenha julgado necessária. Seu método, a esse respeito, sempre foi mais voltado a economizar variáveis através da unificação (espaço-tempo, matéria-energia) ou da depuração (éter) do que a acrescentar. O termo variável escondida, a meu ver, popularizou-se num sentido mais amplo. Muitos dentre os que confundem a visão einsteiniana com a idéia de variáveis ocultas de Bohm, chegam também por vezes a recorrer-se a um teorema de Von Newmann, da década de 30, se não me engano, a provar matematicamente a inexistência de tais "variáveis". E tanto é abrangente o conceito, na visão dos que assumem a generalização do termo variáveis escondidas, que já li posícionamentos a estranhar ou mesmo criticar o teorema de Von Newmann pois após sua publicação teriam surgido as "variáveis escondidas" conhecidas por nêutron, neutrino e antimatéria. Ou seja, popularizou-se demais o conceito a ponto de aceitar-se como "escondido" tudo o que não é conhecido hoje e a ser descoberto amanhã. Novamente volto a dizer que suas colocações são importantes e deveriam ser lidas por um estudioso de física quântica, pois muitos dentre os que tenho encontrado não aprenderam esses conceitos na universidade. De minha parte, ainda que não saiba dizer se a idéia se confunde com a de Bohm, chego a pensar em variáveis escondidas, que acredito existirem, como algo fundamental, essencial e abrangente e não somente a permitirem como também a mostrarem-se essenciais para a unificação de todos os ramos da física. Sob esse aspecto vejo, ao examinar todas as físicas, algo como que a mascarar uma "realidade evidente" e a manifestar-se como uma "imagem de espírito", por vezes imediata, por outras como consequência ou corolário de princípios fundamentais. Existem, na física genuinamente newtoniana, as "vibrações emitidas pelos corpos e que, ao alcançarem a luz infletiriam seus raios"; na física clássica pós-newtoniana existe a concepção de éter, a justificar sua luz ondulatória clássica; para Einstein existiria "a falta de um método sistemático a levar-nos a uma solução o que, dentro de sua maneira sui-generis de enxergar a física, responderia por nossa incapacidade de encontrarmos um conceito de campo independente do conceito de partícula; e para a física quântica parece existir o que tem sido chamado por vácuo quântico, o que não deixa de ser uma "variável escondida" a não contrariar seus princípios básicos. Isto sem me referir à "minha física" onde defendo a existência do que chamo "informação do movimento da matéria", algo imaterial e que, ao se propagar pelo espaço, se confunde em muito com as "vibrações emitidas pela matéria" ou o "espírito da matéria" citados esporadicamente por Newton. E repito aqui o que já afirmei no uol.ciencia em 30/06/99: "Se isto for loucura, somos todos loucos, cada um a sua maneira." Mas o que tem tudo isso a ver com a experiência de Aspect? Aparentemente nada se, conforme você afirma, e acredito que esteja correto, tal experiência servir tão somente como critério a falsear ou a Fisica Quântica ou a Teoria de Variáveis Ocultas de Bohm. A menos que possamos incluir, entre essas (de Bohm) algumas das variáveis referidas acima para as outras físicas que não a quântica. E é por isso que disse, e volto a repetir, que seria interessante que todos estudantes de física quântica ficassem cientes de suas afirmações, pois via de regra eles têem supervalorizado o resultado da experiência de Aspect, postura que tenho observado até mesmo em pós-graduandos que frequentam a Usenet do Brasil e do exterior. Muito interessante sua idéia sobre a contraposição "aparente" entre a experiência EPR e o princípio da incerteza. Caso você esteja correto a respeito, isso parece-me derrubar totalmente aquela idéia de incompatibilidade entre FQ e TR e a que, com frequência me refiro como que dizendo que a teoria quântica e a teoria da relatividade falseiam-se entre si. Isso não muda nada o "status" atual da física, pois ambas são aceitas, mas não deixa de ser um avanço importante do ponto de vista epistemológico. Deixo aos demais leitores da ciencialist [Será que ainda estão nos prestigiando? - Silêncio total - Risos ] a opção de solicitarem ou não sua oferta de expor o fato. Eu, em particular, gostaria muito. Quanto a sua conclusão sobre a experiência de Aspect, aceito como um brilhante desfecho de sua exposição. Fica-me a dúvida sobre aquela história relativa à "impossibilidade em mostrar que o Princípio da Incerteza está contido na hipótese da existência de sistemas de dois níveis". Não porque eu pretenda demonstrar que o princípio da incerteza está errado ou "incerto" ou que seja inconsistente; mas porque acredito na possibilidade de um aperfeiçoamento da experiência de Aspect no sentido de demonstrar que os valores encontrados são parcelas de uma gama de valores outros a compatibilizarem-se com uma física a apoiar-se única e exclusivamente nos conceitos: "espaço", "tempo", "matéria", "movimento da matéria" e "informação do movimento da matéria". E esta, a meu ver, nada mais é do que a física genuinamente newtoniana em seu formato final. [ ]'sAlberto |