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e Acrópolis

 
 

Março a Outubro de 2000 eCC

   Considerações Sobre o Tempo
Parte 1

 

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Msg Ciencialist 4368
De: Alberto Mesquita Filho
Data: Sábado, 25 de Março de 2000

Eduardo Vieira, na msg 4367, escreveu:

Eduardo: Esse negócio de 'tempo não existe' é muito newtoniano pra mim.

Não entendi!!!

Pelo que sei, Isaac Newton, de quem acredito derivar a expressão "newtoniano" utilizada, refere-se ao tempo como "algo absoluto", assim como o espaço. Em alguns trechos de sua obra chega a deixar claro que "não sabe" exatamente o que é o tempo mas jamais negou sua essência e, muito menos, chegou a supor o tempo como algo imaginário ou, mesmo, não existente.

Antes de citar Newton, que você provavelmente conhece por citações feitas por seus professores, saiba que a grande maioria dos físicos modernos jamais leu Newton e vive repetindo cerca de uma centena de asneiras jamais proferidas por Newton.

Eduardo: Se ele não existe, voce vai cair em dificuldades para explicar o que aconteceu antes do 'big-bang', que é o 'inicio do tempo'.

Taí uma coisa que realmente ainda não foi comprovada e não é impossível que nunca tenha existido: o "big-bang".

Desculpe-me pela franqueza mas se você gosta de física moderna (eu, francamente, considero-a um atraso de vida) não deixe de ler dois cientistas que realmente conheciam bastante a física newtoniana, jamais a desprezaram e tentaram, sem conseguir, alicerçar suas teorias em algo realmente sólido:Einstein e Bohr.

Pois Einstein chegou a escrever uma dedicatória que começa com: "A Newton, para quem a natureza não tinha segredos."

Quanto à "existência" das coisas, Einstein (em "Como Vejo o Mundo"), ao "fechar um balanço" sobre alguns absurdos da física moderna, teria dito: "... creio ainda na possibilidade de um modelo da realidade, quer dizer, de uma teoria que represente as coisas mesmas, e não apenas a probabilidade de sua existência."

Ou seja, o que não existe é bom senso na cabeça da maioria dos físicos modernos.

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Alberto


Msg Ciencialist 4455
De: Alberto Mesquita Filho
Data: Quinta-feira, 30 de Março de 2000

Eduardo Vieira, na msg 4450, escreveu:

Eduardo: Quando disse que esse negócio de o tempo não existir era muito 'newtoniano', quis dizer que, como na física newtoniana, espaco e tempo são imutaveis, e como nao temos nenhum controle sobre o tempo, realmente podemos passar a imaginar que o tempo apenas é uma abstração nossa para compreendermos o mundo.

Olá, Eduardo.

Relendo a minha msg percebo que fui um tanto quanto azedo com você. A verdade é que eu não aguento mais ouvir absurdos que jamais foram ditos por Newton. Uma coisa que poucos sabem (e deveriam saber, pois foi amplamente comentado por ele) é que Newton reconhecia que sua teoria era incompleta. E quando digo que uma teoria é incompleta, estou me referindo a seus alicerces e não a suas aplicações.

Nos séculos que se seguiram nada se fez para completar a teoria newtoniana. O que se fez, então, foi a sua axiomatização, ou seja, deram por consumada uma teoria incompleta em suas origens. Com o advento do eletromagnetismo, "não deu outra": A teoria começou a se mostrar inconsistente exatamente onde Newton, com sua visão de excelente teorizador que era, previu que tal poderia acontecer. Assim, em sua Óptica III, legou-nos inúmeras perguntas, afirmando "não dispor de tempo para verificar experimentalmente as respostas". Mas respondeu quase todas e a evolução da física, "ao dar no que deu" ao final do século passado (XIX), demonstrou que ele estava certo. Vale a pena ler na Óptica III (e também nos Principia) coisas que jamais foram comentadas nas escolas:

  1. A ação dos corpos sobre a luz à distância, inclinando os raios (questão 1 original, Óptica III);
     
  2. a curvatura da luz "antes" da refração, algo que jamais seria explicado por uma teoria ondulatória da luz (questão 4);
     
  3. a existência de "vibrações" propagadas entre a luz e os corpos (na realidade campos de forças a orientarem os raios de luz) (questão 17) e a demonstrar que Newton jamais admitiu uma propagação instantânea para a luz, ou seja, com velocidade infinita e a demonstrar também que Newton jamais supôs que a duração deste processo pudesse ser desprezada (e consequentemente, para Newton o tempo existia, sim);
     
  4. Nas questões 18 a 24 faz considerações sobre o meio em que se propagam as "vibrações" descritas anteriormente (para alguns, o éter, para Newton, o espaço absoluto, ainda que faça considerações a respeito desse suposto éter);
     
  5. Nas questões 25 a 28 faz considerações sobre propriedades estranhas apresentadas pelos raios de luz e hoje chamadas polarização, dicroísmo e dupla refração. Na questão 26 fala sobre os "lados" dos raios de luz, como que a assumir a existência de algo muito semelhante ao que no século XX foi incorporado às teorias que falam sobre "spin" (naturalmente estou me referindo a "spin" de bósons, relacionado à polarização da luz).
     
  6. Na questão 28 propõe possíveis explicações para o que hoje chamamos leis da difração, assumindo que a curvatura dos raios de luz "não é em direção à sombra, mas a partir da sombra". As interpretações das leis da difração, como as concebemos hoje, e que foram fundamentais para a "construção" da física quântica, não levam em conta esta direção da inflexão. Conclui a questão 28 rejeitando o éter e reforçando a idéia (já comentada em outros de seus escritos) de uma causa para a gravidade que não a existência pura e simples da matéria. Obviamente, está tentando demonstrar a compatibilidade entre as "vibrações" dos corpos, capazes de "curvar a luz" com os campos de força conhecidos até então.
     
  7. Na questão 29 não apenas reforça o comentado a respeito das "vibrações" mas também deixa claro que não está a fazer "conjecturas". Apoia suas conclusões em experiências efetivamente realizadas. E conclui por um parentesco entre a natureza destas "vibrações" com a "virtude magnética", novamente referindo-se aos "lados da luz", conceito este intimamente relacionado ao que chamamos hoje polarização e/ou "spin".
     
  8. Na questão 30 deixa antever que acreditava na natureza material da luz (luz corpuscular). É importante perceber que aquilo que hoje concebemos como luz não retrata apenas esta natureza corpuscular mas também as "vibrações" trocadas entre os corpos e a luz (aí reside, muito provavelmente, o mistério da dualidade). Obviamente, esta dualidade newtoniana é totalmente diversa da dualidade da física moderna.
     
  9. Na questão 31 questiona a origem dos campos de força conhecidos na época, relacionando-os com as propriedades inerentes aos raios de luz e comentadas nas questões anteriores.
     
  10. Newton conclui a questão 31 deixando claro que sua "mecânica" está incompleta: (notem que trata-se de uma obra sobre Óptica) "E, portanto, não tenho escrúpulos em propor os princípios de movimento acima mencionados, sendo eles de uma extensão muito geral, e deixar suas causas serem descobertas."

Reproduzi acima pequenos detalhes relativos "à lógica suprema, apresentada por todos aqueles que realmente fizeram contribuições importantes em ciência; e, desgraçadamente, criticada, ou mesmo ridicularizada, por todos aqueles que em nome da ciência e, com recursos advindos da ciência, de tudo fazem para escravizar aqueles que não tiveram a felicidade de conhecer a autêntica ciência" (esse trecho extraí de um trabalho que escrevi há tempos atrás).

Eduardo: Só que, com aparecimento de teorias mais complexas, como a da relatividade, o tempo deixou de ser absoluto. Passou a ele tambem depender do referencial. A unica coisa absoluta passou a ser a velocidade da luz.

Bem lembrado. É importante realçar que Einstein nada mais fez do que substituir um absolutismo por outro. E tanto ele sabia disso que não gostava de chamar sua teoria por "teoria da relatividade", posto ser uma teoria tão absolutista, ou mais, do que aquela que, pretensamente, viria a substituir.

Eduardo: Quero aproveitar para lembrar que ciencia nada mais é do que um 'mecanismo de teste'. Não existem verdades absolutas.

Com efeito. O cientista é aquele que procura pela verdade, mesmo sabendo que, provavelmente, jamais irá encontrá-la. Alguns julgam-se donos da verdade mas dificilmente consigo enxergá-los como cientistas.

Eduardo: Uma teoria só é boa enquanto os dados experimentais comprovam esta teoria.

Concordo. E é por acreditar nessa idéia que defendo a física newtoniana e refuto a física moderna.

Eduardo: A física newtoniana foi tida como perfeita enquanto os cientistas não encontraram fenomenos que ela não conseguisse explicar.

Há controvérsias a respeito. No século passado os cientistas não conseguiram explicar determinados desvios da órbita dos planetas utilizando a física clássica. Não me consta que houvesse alguém na época disposto a refutar a física clássica. Os mais ousados começaram a procurar por novos planetas no sistema solar a explicarem os desvios encontrados. Obviamente, até que os novos planetas fossem encontrados, os físicos estavam em apuros pois, até então, tudo se passava como se estivessem aceitando hipóteses "ad hoc".

Hoje em dia a aceitação de hipóteses "ad hoc" não atormenta mais os físicos, posto que cria-se uma ou mais hipóteses "ad hoc" para cada experiência que vá contra a física quântica ou a teoria da relatividade, e ninguém procura verificar se são hipóteses com ou sem fundamento lógico. Lembro que a física quântica é aceita por seus defensores como uma teoria completa. Logo, qualquer hipótese a ser acrescentada será, sem dúvida, uma hipótese "ad hoc". Por outro lado, e como Bohr deixou claro, qualquer tentativa de se acrescentar novas hipóteses fundamentais à teoria terá como consequência sua despersonalização total. Isto não acontece com a física newtoniana, o que também foi deixado claro pelo próprio Newton.

Eduardo: Quando estes fenomenos começaram a ser estudados, ficou claro que eram necessários outras teorias, que a englobassem como um 'caso especial'.

Isto nem sempre é verdadeiro. Essa história de que uma teoria sempre engloba a anterior é "papo furado" de físico medíocre. Aqueles que se julgam donos da verdade não querem admitir que um dia poderão ser suplantados. Criam então uma fantasia a dizer que as asneiras que hoje aceitam como verdades, serão casos particulares de uma verdade maior.

Há dez anos existia, em biologia, cinco teorias a explicarem a fosforilação oxidativa. Apenas uma, ou talvez nenhuma, poderia ser verdadeira, e nenhuma destas era caso particular de qualquer das demais. Na década de 70, em medicina, existiam 19 teorias destinadas a explicar a eclâmpsia (doença hipertensiva relacionada com a gravidez) e sabia-se que pelo menos 18 eram incorretas.

Ora, como pode uma física que tem por limite a velocidade da luz (absoluta, no caso) reduzir-se a outra física que, em teoria, admite velocidades superiores à da luz? Por outro lado, a física clássica "não newtoniana" somente seria um caso particular da teoria da relatividade de Einstein em condições de velocidade nula. Até chegarmos na velocidade nula haverá sempre um fator de erro, por menor que seja; e ao chegarmos na velocidade nula o que chamamos mecânica reduz-se à estática e o limite deixa de ter importância teórica.

Poderíamos, quando muito, dizer que na PRÁTICA as duas teorias fazem previsões e que, ao reduzirmos a velocidade de um hipotético objeto considerado, estas previsões aproximam-se da identidade, tal e qual no limite matemático. Mas isso não é o mesmo que dizer que uma TEORIA é um caso especial da outra, mesmo porque os princípios em que se apoia a teoria da relatividade são os mesmos independentemente da velocidade do objeto considerado. Ou seja, os princípios em que se apoia a física clássica não são casos limites dos princípios em que se apoia a física moderna, ainda que as mensurações deles decorrentes possam, em alguns casos, se identificar. Em resumo, uma TEORIA não é um caso limite da outra.

Eduardo: Sobre a mecanica quantica. ...Enquanto ela explicar a verdade, ela vai ser verdade risos

Gostaria muito de saber qual(is) é(são) essa(s) verdade(s). Há dez anos atrás o "teletransporte" teria sido considerado uma prova evidencial a derrubar a física quântica; há dois anos começaram a chamá-lo por "teletransporte quântico" e hoje já há quem diga que representa uma das maravilhosas previsões da física quântica. Não existe na história das ciências uma única teoria tão supreprotegida quanto a física quântica. Não existe na história das ciências uma única teoria a comportar tantas hipóteses "ad hoc" quanto a física quantica. Se isso é explicar a verdade, então não sei o que seria essa verdade.

Eduardo: Posso estar sendo muito 'romantico' ou ingenuo pensando assim.

O romantismo faz bem à ciência, desde que não se confunda alhos com bugalhos e/ou saiba-se separar o jôio do trigo. Quanto à ingenuidade, todos nós somos mais ou menos ingênuos e, para tal, o tempo é o melhor remédio.

Eduardo: Bem, fisicos da lista, me mostrem que estou errado. Não é uma bravata... quero aprender risos

Como, no sentido estrito do termo, não sou físico, faço minhas as suas palavras risos

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Alberto


Msg Ciencialist 4472
De: Alberto Mesquita Filho
Data: Sexta-feira, 31 de Março de 2000

Na msg 4463, Douglas escreveu:

Douglas: Alberto e ciencialistas,
A física pós-einsteiniana, diz que o tempo "encolhe" quando se aumenta a velocidade. Na antiga e simples expressão v=e/t não acontece isso? Qual a diferença, ou qual a novidade?

Olá Douglas

Eu não sou a pessoa mais indicada para responder suas dúvidas, mesmo porque sou um "físico" newtoniano. Apenas acho que alguém precisa completar a física newtoniana de maneira que ela venha por si só, e sem a apelação para os absurdos aceitos pelos físicos modernos, a explicar algumas aberrações encontradas no final do século passado (em especial, após a aceitação da teoria eletromagnética de Maxwell).

Não obstante, vou reproduzir algo que escrevi há algum tempo. Antes disso vale a pena citar os postulados básicos da teoria da relatividade restrita (ou especial). A teoria aceita como verdadeiras (e portanto sem contestações) as seguintes afirmações:

  1. A velocidade da luz no vácuo é a mesma em todos os sistemas coordenados que se movem uniformemente uns em relação aos outros.
     
  2. Todas as leis da natureza são as mesmas em todos os sistemas coordenados que se movem uniformemente uns em relação aos outros.

Vamos agora ao texto:

O Tempo Relativo:

Imagine que você está na extremidade traseira de um vagão de trem de comprimento e = 1 km e emite, através de uma lanterna, um feixe de luz que será captado por um observador situado na outra extremidade. Como c = e/t (c = velocidade da luz), podemos dizer que o feixe de luz atingirá a extremidade oposta após um intervalo de tempo igual a t = e/c = 1/300000 s (isto em acordo com a teoria da relatividade, pois c = 300000 km/s).

Admita, ainda, que o trem se move, em relação à terra firme a uma velocidade igual a 90% da velocidade da luz, ou seja, v = 270000 km/s. Um observador externo ao trem verificará que, em relação ao seu referencial, a luz percorre um espaço L superior ao comprimento do trem; isto porque, estando o trem em movimento, a parede dianteira se afasta do raio de luz (isto seria previsto até mesmo pela teoria clássica). Como pela teoria da relatividade c independe do referencial, o observador externo calculará o tempo percorrido pela luz como t = E/c, em que E é igual ao comprimento do trem mais um fator clássico e dependente de sua velocidade, entrando aqui também um fator relativístico a que alguns costumam chamar por "contração" do trem (isto graças ao postulado 1 citado acima).

De qualquer forma, o efeito resultante será que o tempo calculado pelo observador externo ao trem é diferente do tempo calculado pelo observador passageiro do trem (e isto graças ao fator relativístico considerado bem como à constância absoluta de c —observar que após as correções relativísticas, E continua diferente de e). E, no entanto, ambos mediram o tempo decorrido pela mesma experiência, apenas que observada por referenciais diferentes. A conclusão a que se chega é que, pela teoria da relatividade de Einstein, o tempo é diferente para cada referencial. Ou que os relógios deverão andar em ritmos diferentes.

A teoria é totalmente estranha e, eu diria mesmo, absurda, não fosse por uma constatação experimental já praticamente comprovada. Por incrível que pareça, relógios ultraprecisos atrasam-se quando sujeitos a grandes velocidades.

Será que a única explicação para a relatividade do tempo é aquela dada pela teoria da relatividade einsteiniana? Afinal, o que é um relógio?

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Alberto

PS.: "Contração" e/ou "dilatação" do espaço/tempo são efeitos relativos. Ao que tudo indica, ninguém iria se sentir esmagado ou, então, com a sensação de que o tempo passa mais depressa ao embarcar numa nave relativística (pelo menos após cessar o efeito devido à aceleração). As distorções ocorrem ao compararmos medições efetuadas num referencial com medições efetuadas no outro.


Msg Ciencialist 4794
De: Alberto Mesquita Filho
Data: Sábado, 27 de Maio de 2000

Na msg 4793, Manuel Bulcão escreveu:

Manuel: Seria o tempo uma especie de quarta dimensao do espaco?

Raciocinando fisicamente e classicamente, a idéia de tempo como dimensão do espaço surge como um construto matemático a nos facilitar a compreensão do movimento. O que fazemos, na realidade, nada mais é do que tomar várias imagens a representarem uma posição no espaço em tempos distintos. Daí a chamar esta representação por dimensão espacial, vai muito de imaginação e, por si só, nada de realidade física. As imagens, assim visualizadas, não existem concomitantemente. A lógica e a matemática aceitam tudo que tenha lógica e que não contenha erros de cálculo. Não obstante, física não é matemática, ainda que a construção de modelos matemáticos, para a interpretação da realidade física, seja algo muito ao sabor dos físicos modernos, e até mesmo dos clássicos.

Manuel: O problema eh que a teoria geral da relatividade nao permite um modelo de universo deste tipo.

As teorias são feitas na tentativa de explicar e não de complicar. Na história do Universo o que verificamos é que o tempo passa, as teorias caem, e o Universo permanece como tal.

Manuel: A teoria geral da relatividade impede, pois, a eterna recorrencia.

Idem, ibidem.

Manuel: Sim, no entanto a teoria da relatividade, longe de sepultar a estranha ideia de uma existencia ao mesmo tempo limitada e eterna, deu-lhe uma base nova e muito mais solida. Eh que, de acordo com essa teoria, a percepçao do tempo (o tempo como um fluxo) nao se confunde com o tempo "real",

Em outras palavras, o tempo aí descrito, não é o verdadeiro tempo, mas um mero construto matemático. E o que é o tempo então?

Manuel: ...do mesmo modo que as cores nao sao ondulaçoes no campo eletromagnetico, mas apenas o efeito destas em nossas retinas. Ademais, essa teoria estabelece que o espaco e o tempo formam um "continuum", e que esse continuum espacio-temporal eh algo dado de uma vez para sempre (o tempo seria, apenas, uma especie de quarta dimensao do espaço).

Sim, mas que tempo seria esse que não é nem representa o tempo "real"?

Manuel: Ou seja, Einstein estava convencido que o nascimento e a morte sao apenas as extremidades temporais de algo que existe na eternidade.
Einstein estaria certo? Serah que, apesar de mortais, somos eternos? Essa ideia bizarra me faz lembrar o titulo de um romance de Milan Kundera: A Insustentavel Leveza do Ser. Alias, nesse livro o autor especula sobre o mito do eterno retorno.

Sim, mas o tempo "real" existe ou não? E qual o significado deste retorno? Retornamos ao passado ou ao futuro? Se ao passado, estamos aprisionados no tempo; se ao futuro, estamos livres no espaço.

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Alberto


Msg Acropolis 3486
De: Alberto Mesquita Filho
Data: Sexta-feira, 31 de Agosto de 2000

Na msg Acropolis 3478, Manuel Bulcão escreveu:

Manuel: Mais um preciosismo, bem ao gosto dos masturbadores intelectuais, como eu risos:
"Qual a espessura do presente?"
O passado não existe mais, o futuro ainda não existe. Vale dizer, o passado e o futuro não existem. Então, só existe o presente. Respondam-me, então: qual a duração do presente?
O futuro passa para o passado no limite "zero", ou seja, o presente não tem uma duração.
Logo, se nem o presente tem uma duração, então não existe passado, nem presente, nem futuro.
Não existe tempo, Eis a conclusão insofismável!

Interessantíssimo esse seu questionamento. E ainda que tenha sido objeto de disputas milenares, permanece ainda insolúvel. Pois "o que é" não pode ser exatamente "o que foi" nem "o que virá a ser", pois tudo muda, "tudo está em movimento". Mas se, como constatamos no dia-a-dia, tudo muda, isto significa que o passado existiu e podemos inferir que o futuro existe em nosso pensamento, ainda que jamais possamos dizer que existirá de fato, pois que "ele" está sempre fugindo de nós. Por outro lado, se nada estivesse em movimento, ou se o Universo fosse totalmente estático, não sei se um ser supremo e imaterial poderia raciocinar em termos de passado, presente ou futuro ou se pensaria simplesmente num presente imutável. Também não sei que critérios ele utilizaria, a menos que o "seu mundo" exterior ao Universo, estivesse dotado de movimento, caso tentasse caracterizar a temporalidade do Universo. Sei apenas que se tudo estivesse em repouso, "para nós" não existiria nem passado, nem presente, nem futuro, pois que somos consequência do movimento da matéria, logo não existiríamos. Mas se existimos e somos movimento, isto, à primeira vista, significa que o tempo existe. Logo, temos a sensação de que o passado existiu, o presente é uma singularidade e o futuro continuará sempre fugindo de nós.

Manuel: Ou haverá uma diferença entre o tempo e o fluxo do tempo? Entre o tempo e o que ele é para nós?

Há alguns anos (1993), num contexto um pouco diverso, procurei por um relacionamento entre tempo e fluxo. Estava a desenvolver uma teoria eletromagnética sem utilizar os pressupostos assumidos por Maxwell, Faraday, Ampère, Coulomb, etc, e a pensar em "alguma coisa" emitida pelos elétrons e a gerar os campos eletromagnéticos. Chamei esta "alguma coisa" por informação eletromagnética. Cheguei então a escrever o seguinte (O texto está no item "2.4 Comentários sobre H-2" e a teoria completa pode ser encontrada em "A equação do elétron e o eletromagnetismo"):

A física clássica é redutível a conceitos fundamentais como espaço, tempo, matéria e movimento. As informações escapam a este reducionismo: são autóctones, ainda que fluam, posto que são emitidas (H-2). O termo fluxo é abrangente mas pode sempre ser relacionado a alguma coisa que flui ou corre através de uma fronteira real ou imaginária: uma corrente de água, uma rajada de metralhadora, o som, a luz, a lava de umvulcão... ou mesmo a humanidade que flui através da história. Os antigos associaram-no ao movimento, ao tempo, à dinâmica, à evolução. Para Heráclito, o Obscuro, o fluxo era essencial à existência; Aristóteles associou o fluxo a uma causa: o ato à potência; e Epicuro fundiu o atomismo de Demócrito ao aleatorismo de Heráclito e ao causalismo de Aristóteles para concluir que a mortalidade decorre da imortalidade: a forma permanece embora a substância mude.

Na física de campos surge um conceito novo: o fluxo sem matéria. Real ou imaginário, concreto ou abstrato, a verdade é que existindo um campo, algo flui. Atravessa o vácuo, permeia as moléculas, dilui-se e não respeita o infinito. Não necessita de um meio para se propagar. Com efeito, o éter não existe. Sua sede é o espaço; sua existência é o campo; sua natureza é o nada.

Na idéia de campo existe então "um nada", no sentido material que damos hoje ao termo existir, e que não obstante exerce um efeito (Assim como o tempo que manifesta-se a nós através do passado a retratar a história do movimento). Ou seja, sua natureza (a das informações) é o nada e no entanto as informações existem, pois se manifestam. A esta "alguma coisa" imaterial e a que chamo "informação eletromagnética ou gravitacional" Newton, aquele que segundo dizem "não fazia hipóteses", em alguns textos refere-se como "o espírito da matéria", podendo-se também interpretar como "um nada" que efetivamente existe. Vejamos então como, a partir do texto acima apresentado, cheguei a concluir que para Newton a gravitação era um nada que existia:

Um campo pode se modificar e, assim fazendo, transporta energia; e um campo estacionário pode ser imaginado como energia localizada no espaço. Mas energia, mesmo a potencial, é algo que flui, posto que age! Como é possível alguma coisa se localizar e fluir ao mesmo tempo? Existe, realmente, uma dualidade intrínseca ao conceito de campo; dualidade esta que poderia ser resolvida admitindo-se um éter de energia, sede de alguma coisa imaterial que se propaga e que se manifesta localmente como energia: materializa-se ao ser observada, para utilizar uma expressão que seria do agrado de um físico realista do nosso século, sem ser totalmente contrária à interpretação ortodoxa da física quântica. Vejamos o pensamento de um grande cientista e filósofo da ciência.
É inconcebível que a matéria bruta inanimada possa, sem a mediação de alguma coisa, que não é material, atuar sobre, e afetar outra matéria sem contato mútuo, como deve ser, se a gravitação no sentido de Epicuro for essencial e inerente a ela. E esta á uma razão pela qual desejo não me seja atribuída a gravidade inata. Que a gravitação seja inata, inerente e essencial à matéria, de modo que um corpo possa atuar sobre outro a distância, através do vácuo, sem a mediação de mais nenhuma coisa, pela qual e através da qual sua ação e sua força fosse transportada de um até outro, é para mim absurdo tão grande, que acredito que homem algum que tenha em questões filosóficas competente faculdade de pensar, possa cair nele. A gravidade deve ser causada por um agente que atua constantemente, de acordo com certas leis; mas deixo à consideração de meus leitores se este agente é material ou imaterial (Newton).

E após mais algumas considerações concluo o item com o seguinte parágrafo:

O que flui num campo de temperaturas é chamado calor; o que flui num campo de velocidades pode ser chamado vazão e/ou momento; o que flui num campo eletromagnético chamarei informação eletromagnética. A informação eletromagnética pode existir ou não; existindo, pode ser importante ou não. Existindo ou não, o importante é perceber que o campo eletromagnético estacionário não se propaga, assim como calor não é temperatura. Consequentemente, a informação a que me refiro não é uma onda eletromagnética, embora uma onda eletromagnética transmita informação.
Manuel: Decifra-me ou devoro-te!

Pois eu acho que a solução do problema não está no tempo existir ou não existir. Sob esse aspecto, sou mais Heráclito: "O fluxo é essencial à existência." E, sob esse ponto de vista, o tempo não existe pois o conceito de tempo precede o conceito de existência.

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Alberto


Msg News:uol.educacao.ciencia.astronomia 1
De: "zk"
Data: Sexta-feira, 31 de Agosto de 2000

Particularmente referente ao que Gleiser escreveu.

Gleiser: Portanto, para sermos coerentes em nossas definições, o presente não pode ter duração no tempo. Ou seja, o presente não existe!"

O problema é que ele não foi capaz ainda de compreender que algo para existir não necessita de duração no tempo. É fácil compreender que passado e futuro existem em nossas mentes. Bom ,se existem em nossas mentes existem no presente pois a nossa mente (como contenedora de nossas memórias e pensamentos) existe no presente. O tempo então está na nossa mente.

Se o tempo está na mente,a mente não está no tempo, porque algo não pode conter e estar contido ao mesmo tempo pela mesma coisa. Qualquer coisa que não está no tempo não tem início nem fim, porque se determinamos início e fim determinamos um período de tempo. Qualquer coisa que existe e não tem início nem fim é eterna.

Então concluimos que a mente é eterna. Cabe aqui notar que eternidade não deve ser compreendida como uma extenção infinita do tempo numa dupla direção passado-futuro, mas como algo além do tempo. O presente como ponto entre o passado e futuro é a 'porta' de entrada e saída da dimenção temporal, ele está ligado ao tempo mas também ao não-tempo (eternidade).

O presente também não tem início nem fim, ele nunca começa e nunca termina. Portanto o presente não pertence ao tempo, mas à eternidade, ele não existe na mente mas coesiste com a mente mantendo-a presente (ligada a ele) enquanto esta gera o tempo e o espaço a partir da constante manifestação da presença.

Somos levados a concluir que tudo o que existe existe no presente e que esta presença eterna de onde tudo emerge é a causa da mente que é por consequência a causa do tempo e do espaço ( e de tudo que há no espaço).

É claro que nós, como nos consideramos, seres corporais, biológicos, somos algo com duração no tempo e localização no espaço. Mas nós como mente estamos além do tempo e do espaço, e como mente eterna geramos nossa dimensão corpórea-temporal. Nossa dimensão corpórea temporal, só existe enquanto criação da mente incorpórea e não-temporal, tem nela sua causa, origem e destino.

zk.


Msg News:uol.educacao.ciencia.astronomia 2
De: Alberto Mesquita Filho
Data: Sábado, 2 de Setembro de 2000

Na msg news.uol 1, "zk" escreveu:

zk: Particularmente referente ao que Gleiser escreveu.
Gleiser: Portanto, para sermos coerentes em nossas definições, o presente não pode ter duração no tempo. Ou seja, o presente não existe!"
zk: O problema é que ele não foi capaz ainda de compreender que algo para existir não necessita de duração no tempo.

É possível que ele não tenha estudado geografia e/ou não entendeu que assim como "existem" linhas imaginárias (por exemplo, os trópicos de Capricórnio ou Câncer) a separarem espaços reais, pode-se pensar também na existência de limites temporais imaginários, a ponto de podermos utilizar os termos "antes de..." e "após o...". Provavelmente ele confunde limite com fronteira dotada de "espessura alfandegária".

zk: É fácil compreender que passado e futuro existem em nossas mentes. Bom ,se existem em nossas mentes existem no presente pois a nossa mente (como contenedora de nossas memórias e pensamentos) existe no presente. O tempo então está na nossa mente.

Com efeito. Recentemente escrevi para a lista de discussão acrópolis —msg 3486 —algo nesse sentido (em resposta à msg "A espessura do presente" de Manuel Bulcão, e repito abaixo:

"...se, como constatamos no dia-a-dia, tudo muda, isto significa que o passado existiu e podemos inferir que o futuro existe em nosso pensamento, ainda que jamais possamos dizer que existirá de fato, pois que "ele" está sempre fugindo de nós. Por outro lado, se nada estivesse em movimento, ou se o Universo fosse totalmente estático, não sei se um ser supremo e imaterial poderia raciocinar em termos de passado, presente ou futuro ou se pensaria simplesmente num presente imutável. Também não sei que critérios ele utilizaria (a menos que o "seu mundo" exterior ao Universo, estivesse dotado de movimento) caso tentasse caracterizar a temporalidade do Universo. Sei apenas que se tudo estivesse em repouso, "para nós" não existiria nem passado, nem presente, nem futuro, pois que somos conseqüência do movimento da matéria, logo não existiríamos. Mas se existimos e somos movimento, isto, à primeira vista, significa que o tempo existe. Logo, temos a sensação de que o passado existiu, o presente é uma singularidade e o futuro continuará sempre fugindo de nós."
zk: Se o tempo está na mente,a mente não está no tempo, porque algo não pode conter e estar contido ao mesmo tempo pela mesma coisa.

Com efeito. Parece-me que no século XX não se fez outra coisa que não confundir conteúdo com continente. Por esta e outras confusões costumo dizer (vide Chamberland e o Paraíso Perdido, editora Ateniense, 1991) que o século XX passará para a história como o século da mentira. Acredito que estamos lentamente saindo dessa crise e o século XXI nos colocará frente a uma nova realidade.

Muito interessante sua maneira de filosofar sobre "o presente não ter início nem fim, nunca começar e nunca terminar". Pois é exatamente aí que surge a noção de fluxo, um conceito abrangente mas que "pode sempre ser relacionado a alguma coisa que flui ou corre através de uma fronteira real ou imaginária: uma corrente de água, uma rajada de metralhadora, o som, a luz, a lava de um vulcão... ou mesmo a humanidade que flui através da história". Para quem observa o fluxo, não há como abstrair-se de possíveis fronteirasimaginárias. Não obstante, para quem faz parte do fluxo (seja uma molécula, de água, ou mesmo nós, como parte da humanidade) é como se estivéssemos numa fronteira móvel a que damos o nome de "presente".

Por falar em fluxo, e de sua relação com o tempo, não podemos esquecer de Heráclito, para o qual "o fluxo era essencial à existência". Como também não podemos ignorar os sábios conhecimentos orientais antigos a afirmarem "tudo está em movimento". Ou seja, não há nada em repouso e a existência é conseqüência do movimento. Esta maneira de pensar chegou a ser ressuscitada, na década de 30, por Einstein, ainda que num contexto um pouco diferente, quando iniciou sua vã procura pela teoria do campo unificado.

Mas se pretendermos caracterizar o "existir" como decorrência do movimento, o que é uma outra maneira de dizer que "o movimento é essencial à existência", e como o movimento é decorrência do tempo, chegaremos a conclusão de que tempo e movimento não existem mas são entidades pré-existentes. E, com efeito, espaço, tempo, matéria e movimento são entidades não-físicas, ou seja, metafísicas. Aceitamos a sua existência mas eles são, com efeito, pré-existentes. E assim como ponto, reta e plano da geometria euclidiana, eles não têm definição. O que não significa dizer que não existem pois eles estão acima da existência: eles pré-existem.

[ ]'s
Alberto


Msg email 1
De: Manuel Bulcão
Para: Alberto Mesquita Filho
Assunto: A Rapidez do Tempo
Data: Sábado, 16 de Setembro de 2000

Olá, Alberto!

Passeando hoje pelos newgroups do UOL, li uma mensagem sua, na lista "Ciência", ou "Astronomia" (não me lembro), em que você, comentando o tema "O Tempo Realmente Flui?", cita o meu nome. Enquanto lia seu texto, a região pré-frontal do meu cérebro foi acometida por uma violenta comichão.

Postei então um e-mail, "A Rapidez do Tempo" (nick "Soares"). Como a sua opinião pesa muito (acho interessante o seu ponto de vista, embora não concorde integralmente com ele), resolvi remeter-lhe o dito e-mail diretamente para você. O texto segue abaixo. Espero uma resposta. PS: peço-lhe para remeter este e-mail (de preferência, juntamente com a sua resposta) para a lista Acrópolis, onde o meu e-mail "A Espessura do Presente" ainda está rendendo alguns comentários.

<< Uma pergunta sobre o tempo:

Se o tempo flui realmente, então com que rapidez o tempo flui?

Talvez alguém responda: um segundo por segundo. Absurdo! A velocidade é a distância percorrida por unidade de tempo. Como o tempo pode se movimentar no tempo?

Talvez alguém objete: como o tempo é relativo à posição e à velocidade do observador, podemos nos valer do "tempo próprio" de um observador X como medida de velocidade do tempo de todos os outros observadores. Assim, podemos dizer que o tempo passa, para o observador Y, a uma velocidade de "n" seguntos "y" por segundo "x".

Ok. Mas, para que o observador X e seu respectivo "tempo próprio" não seja uma decisão arbitrária, subjetiva, devemos escolher como observador padrão aquele cuja velocidade ou situação gravitacional seja uma constante universal. Qual seria ele, então? Não vejo outro que não seja o fóton.

No entanto, em seu "tempo próprio", o fóton percorre quaisquer distâncias em "zero" segundo. Vale dizer, um segundo no tempo próprio "f" do fóton tem uma extensão infinita! Sendo assim, a rapidez com que o tempo passa para qualquer observador é de "n" segundos (qualquer que seja o valor de "n") em 0 (zero) segundo "f".

Em suma, considerando-se o tempo próprio "f" do fóton como medida de velocidade do fluxo do tempo de todo e qualquer observador, concluiremos que a rapidez com que flui o tempo é... "infinita"(!)

Ora, um tempo que flui a uma velocidade infinita não tem, a rigor, uma "duração". Por isso, acho que não existe um fluxo "objetivo" do tempo.>>

[ ]'s
Manuel Bulcão


Msg Acropolis 3590
De: Alberto Mesquita Filho
Data: Domingo, 17 de Setembro de 2000

Olá, lista

Recebi o seguinte e-mail do Manuel Bulcão:

Manuel: Passeando hoje pelos newgroups do UOL, li uma mensagem sua, na lista "Ciência", ou "Astronomia" (não me lembro),...

Trata-se do news uol.educacao.ciencia.astronomia e a msg foi escrita em 02/09/00 em resposta à msg do zk na thread "O tempo realmente flui?" Nesta msg, além de repetir coisas que já postei aqui na Acrópolis, na thread "A espessura do presente", comentei o seguinte:

zk escreveu, dentre outras coisas:

Se o tempo está na mente, a mente não está no tempo, porque algo não pode conter e estar contido ao mesmo tempo pela mesma coisa. Qualquer coisa que não está no tempo não tem início nem fim, porque se determinamos início e fim determinamos um período de tempo. Qualquer coisa que existe e não tem início nem fim é eterna.

E eu respondi:

Com efeito. Parece-me que no século XX não se fez outra coisa que não confundir conteúdo com continente. Por esta e outras confusões costumo dizer (vide Chamberland e o Paraíso Perdido, editora Ateniense, 1991) que o século XX passará para a história como o século da mentira. Acredito que estamos lentamente saindo dessa crise e o século XXI nos colocará frente a uma nova realidade.

Muito interessante sua maneira de filosofar sobre "o presente não ter início nem fim, nunca começar e nunca terminar". Pois é exatamente aí que surge a noção de fluxo, um conceito abrangente mas que "pode sempre ser relacionado a alguma coisa que flui ou corre através de uma fronteira real ou imaginária: uma corrente de água, uma rajada de metralhadora, o som, a luz,a lava de um vulcão... ou mesmo a humanidade que flui através da história". Para quem observa o fluxo, não há como abstrair-se de possíveis fronteiras imaginárias. Não obstante, para quem faz parte do fluxo (seja uma molécula, de água, ou mesmo nós, como parte da humanidade) é como se estivéssemos numa fronteira móvel a que damos o nome de "presente".

Por falar em fluxo, e de sua relação com o tempo, não podemos esquecer de Heráclito, para o qual "o fluxo era essencial à existência". Como também não podemos ignorar os sábios conhecimentos orientais antigos a afirmarem "tudo está em movimento". Ou seja, não há nada em repouso e a existência é conseqüência do movimento. Esta maneira de pensar chegou a ser ressuscitada, na década de 30, por Einstein, ainda que num contexto um pouco diferente, quando iniciou sua vã procura pela teoria do campo unificado.

Mas se pretendermos caracterizar o "existir" como decorrência do movimento, o que é uma outra maneira de dizer que "o movimento é essencial à existência", e como o movimento é decorrência do tempo, chegaremos a conclusão de que tempo e movimento não existem mas são entidades pré-existentes. E, com efeito, espaço, tempo, matéria e movimento são entidades não-físicas, ou seja, metafísicas. Aceitamos a sua existência mas eles são, com efeito, pré-existentes. E assim como ponto, reta e plano da geometria euclidiana, eles não têm definição. O que não significa dizer que não existem pois eles estão acima da existência: eles pré-existem.

Manuel: ...em que você, comentando o tema "O Tempo Realmente Flui?", cita o meu nome. Enquanto lia seu texto, a região pré-frontal do meu cérebro foi acometida por uma violenta comichão. Postei então um e-mail, "A Rapidez do Tempo" (nick "Soares")...

Alberto: A msg citada está em "uol.educacao.ciencia" e em "uol.filosofia" (16/09/00).

Manuel: Como a sua opinião pesa muito (acho interessante o seu ponto de vista, embora não concorde integralmente com ele), resolvi remeter-lhe o dito e-mail diretamente para você. O texto segue abaixo. Espero uma resposta. PS: peço-lhe para remeter este e-mail (de preferência, juntamente com a sua resposta) para a lista Acrópolis, onde o meu e-mail "A Espessura do Presente" ainda está rendendo alguns comentários.

O texto segue abaixo (Msg email-1 acima - clique aqui para ler). Responderei brevemente, aqui na Acropolis.

[ ]'s ao Manuel e a todos os assinantes da lista.
Alberto


Msg Acropolis 3601
De: Alberto Mesquita Filho
Data: Segunda-feira, 18 de Setembro de 2000

Olá, Manuel, Evandro e demais membros da Acrópolis

Conforme prometi, vou discorrer alguma coisa em resposta à msg do Manuel e também à resposta do Evandro, em especial na parte que me toca.

Esclareço, inicialmente, que a idéia de "fluxo do tempo" não é minha mas, como espero ter esclarecido anteriormente, estava contida no título da msg original do zk, qual seja, "O tempo realmente flui?" postada no uol.educacao.ciencia.astronomia. O que eu afirmei a respeito, na época, foi o seguinte:

"Muito interessante sua maneira de filosofar sobre 'o presente não ter início nem fim, nunca começar e nunca terminar'. Pois é exatamente aí que surge a noção de fluxo, um conceito abrangente mas que 'pode sempre ser relacionado a alguma coisa que flui ou corre através de uma fronteira real ou imaginária: uma corrente de água, uma rajada de metralhadora, o som, a luz, a lava de um vulcão... ou mesmo a humanidade que flui através da história'. Para quem observa o fluxo, não há como abstrair-se de possíveis fronteiras imaginárias. Não obstante, para quem faz parte do fluxo (seja uma molécula, de água, ou mesmo nós, como parte da humanidade) é como se estivéssemos numa fronteira móvel a que damos o nome de "presente.

Por falar em fluxo, e de sua relação com o tempo, não podemos esquecer de Heráclito, para o qual 'o fluxo era essencial à existência'. Como também não podemos ignorar os sábios conhecimentos orientais antigos a afirmarem 'tudo está em movimento'. Ou seja, não há nada em repouso e a existência é consequência do movimento. Esta maneira de pensar chegou a ser ressuscitada, na década de 30, por Einstein, ainda que num contexto um pouco diferente, quando iniciou sua vã procura pela teoria do campo unificado."

Ou seja, sem endossar a idéia de "fluxo do tempo", comentei sobre a relação fluxo-tempo, o que é bem diferente. Espero ter deixado claro nos exemplos acima citados que os fluxos referidos não seriam de tempo mas sim de água, projéteis de metralhadora, vibrações sonoras, ondas eletromagnéticas, lava de vulcão e homens. O fluxo seria então uma das maneiras de retratarmos ou concebermos a idéia de tempo. Ao observar uma superfície por onde passa uma corrente de água, poderia dizer que existe alguma coisa a que darei o nome de tempo e graças à qual consigo entender a passagem da água através desta superfície. Seria o mesmo que dizer que pelo fato de existir o movimento, posso conceber a idéia de tempo. De maneira resumida, e não sei dizer se de todo certa, costumo afirmar que assim como a matéria ocupa o espaço, o movimento ocupa o tempo.

Confusões deste tipo, entre movimento (ou fluxo) e tempo, são muito comuns em ciência e confesso mesmo que nem cheguei a me dar conta do absurdo contido no título da mensagem original. Respondi-a como se a mensagem meramente relacionasse o fluxo ao tempo, o que parece-me algo por demais óbvio. Um exemplo típico de confusão similar é o de calor com temperatura. A esse respeito cheguei a escrever num trabalho relativo a eletromagnetismo (A equação do elétron e o eletromagnetismo):

É importante, em física, saber distinguir certos conceitos aparentados. É clássica a confusão do principiante em termodinâmica entre calor e temperatura. Como é comum se pensar que o que flui num campo de velocidades é a velocidade. Raciocinando em termos de campo podemos conceituar o calor como a entidade que flui em um campo de temperaturas. O campo de velocidades é um pouco mais complexo; ou, quem sabe, um pouco melhor conhecido. Aí, o que flui pode ser encarado sob vários prismas: vazão ou volume de fluido que atravessa uma superfície na unidade de tempo; massa correspondente ao volume assinalado; quantidade de matéria, idem, expressa sob a forma de número de partículas elementares. Para cada prisma um valor, um número diferente que retrata a mesma coisa. Além do prisma podemos variar a óptica e pensar no que flui não no sentido da corrente mas em virtude do grau de liberdade e da coesão entre as moléculas de fluido. Assim sendo temos um fluxo de momento propagando-se perpendicularmente a sua própria direção: é um fluxo gerando outro fluxo ou, melhor dizendo, é um campo tensorial gerando um campo vetorial.

O que flui num campo de temperaturas é chamado calor; o que flui num campo de velocidades pode ser chamado vazão e/ou momento; o que flui num campo eletromagnético chamarei informação eletromagnética. A informação eletromagnética pode existir ou não; existindo, pode ser importante ou não. Existindo ou não, o importante é perceber que o campo eletromagnético estacionário não se propaga, assim como calor não é temperatura. Consequentemente, a informação a que me refiro não é uma onda eletromagnética, embora uma onda eletromagnética transmita informação.

Quanto à existência ou não do tempo, parece-me tratar-se de um problema de natureza semântica. Alguma coisa existe e a esta alguma coisa dou o nome de tempo. Talvez a duvida principal não resida no conceito de tempo mas no conceito de existência. E foi pensando nisso que escrevi, em minha resposta ao zk, o seguinte:

Mas se pretendermos caracterizar o "existir" como decorrência do movimento, o que é uma outra maneira de dizer que "o movimento é essencial à existência", e como o movimento é decorrência do tempo, chegaremos a conclusão de que tempo e movimento não existem mas são entidades pré-existentes. E, com efeito, espaço, tempo, matéria e movimento são entidades não-físicas, ou seja, metafísicas. Aceitamos a sua existência mas eles são, com efeito, pré-existentes. E assim como ponto, reta e plano da geometria euclidiana, eles não têm definição. O que não significa dizer que não existem pois eles estão acima da existência: eles pré-existem [parece-me não haver muita diferença entre o que estou chamando de "pré-existência" e o ponto de vista de Kant, como comentado pelo Evandro — Nota acrescentada nesta msg].

Sob esse aspecto diria que as pedras fundamentais (ou os "pré-existentes") da física, como a enxergo, são cinco:

  1. espaço
  2. tempo
  3. matéria
  4. movimento da matéria
  5. informação do movimento da matéria.

A física newtoniana contém apenas os quatro primeiros elementos, deixando em aberto a unificação da mecânica com a gravitação, a não ser pela identidade do conceito força. A física moderna descaracterizou totalmente a física newtoniana ao confundir espaço com tempo e matéria com energia (movimento), graças a uma má interpretação (ação à distância, erroneamente atribuída a Newton) do conceito de campo, que estaria contido no quinto elemento citado. Os cinco elementos são fundamentais para a física que ora estou propondo em substituição à física moderna e a complementar a física newtoniana. Como não confundo espaço com tempo, na física que proponho não há como se falar em fluxo do tempo. Não sei se os relativistas modernos poderiam fazer esta afirmação com a mesma firmeza. O Manuel diz alguma coisa sobre "tempo próprio do fóton", coisa que para mim soa como sem sentido e deixaria qualquer consideração a cargo dos relativistas.

[ ]'s
Alberto


Msg email 2
De: Manuel Bulcão
Para: Alberto Mesquita Filho
Assunto: O Tempo Proprio do Foton
Data: Terça-feira, 19 de Setembro de 2000

Olá, Mesquita

Em sua resposta ao meu e-mail "A Rapidez do Tempo" você afirmou que a expressão "tempo próprio do fóton", por mim utilizada, soa-lhe como algo desprovido de sentido.

Sou um leigo em física moderna. Meus conhecimentos neste campo, eu os obtive mediante a leitura de livros de divulgação científica, ou então de livros de físicos em que os mesmos tratam da relação entre os princípios gerais da física e alguns temas filosóficos. Por isso, desculpe-me algumas afirmações tolas que porventura eu venha a dizer. Afinal, Hawking certa vez disse que, até hoje, são poucos os físicos que têm uma compreensão satisfatória da Teoria da Relatividade. Imagine, então, a minha compreensão.risos

Sobre a expressão "tempo próprio do fóton", vou tentar explicá-la: pelo que eu entendo da teoria da relatividade, o tempo e o espaço são relativos à posição gravitacional e à velocidade dos entes físicos (que podem ser um cometa, um observador consciente, um relógio, outro qualquer instrumento de medida, um átomo, uma partícula subatômica, um "fóton", etc.)

De acordo com a minha compreensão, quanto mais a velocidade do "observador" se aproxima da velocidade da luz, mais o espaço que ele ocupa se contrai (se achata na direção do movimento) e, de um modo inverso, o tempo que lhe é relativo (tempo próprio) se dilata. Isto é, para um homem numa espaçonave que se desloca próximo à velocidade da luz, os segundos, horas, dias, etc. transcorrem mais devagar, relativamente a nós, que permanecemos na Terra. Desorte que, ao voltar da sua viagem, e se por acaso ele tiver um irmão gêmeo por aqui, perceberá o astronauta que o seu irmão envelheceu mais rápido do que ele.

Se o tempo se dilata na medida que o "observador" se aproxima da velocidade da luz, ao atingi-la (se isso fosse possível para um objeto com massa inercial), o tempo que lhe é relativo - seu tempo "próprio" - adquire uma extensão infinita. Ou seja, para o observador em questão, o tempo pára, o que é o mesmo que dizer que ele percorrerá qualquer distância em "zero" segundo: tempo = 0, considerando-se, obviamente, o tempo que lhe é relativo.

Sabemos, entretanto, que somente partículas sem massa intrínseca, como os fótons, e talvez os neutrinos, são capazes de se deslocar a uma velocidade de 300.000 km/s. Por isso que me referi a esse tempo "parado" como o "tempo próprio do fóton".

Veja o que diz o químico e filósofo alemão Robert Havemann, a respeito do fóton, em sua obra "Dialética sem Dogma", pág. 123: "(.) Observemos um quantum de luz, formado no Sol e que se movimenta em direção à Terra. Na medida em que chega à Terra e entra em ação recíproca com a matéria aqui existente, ele desaparece. Deixa de existir. Sua energia fez que determinados elétrons se elevassem em uma órbita energeticamente mais rica, ou qualquer outra modificação. O que era, então, o quantum de luz no momento em que se dirigia do Sol para a Terra? Tomamos a teoria da relatividade em busca de esclarecimento, isto é, para saber em que estado se encontrava o quantum de luz durante os oito minutos que dura a sua viagem do Sol à Terra. Qual o tempo próprio do fóton em seu movimento em direção à Terra? Chegamosa um resultado altamente paradoxal: o tempo próprio é igual a zero. Uma vez que ele se movimenta com a velocidade da luz, a extensão do tempo é infinita. O fóton - medido em seu próprio tempo - já havia desaparecido no momento mesmo que apareceu. Os quanta de luz são formas admiráveis de interação entre fenômenos naturais. Os que possuem massa em repouso têm pelo menos a possibilidade de existir durante um certo momento em seu próprio tempo, mesmo sem exercer qualquer ação (.)"

Quanto ao fato de "o espaço se encolher quando o tempo estica", isso é uma prova de que tempo e espaço formam, na verdade, uma coisa só, "espaço-tempo". É como um bastão que, ao ter sua largura e espessura premidas, torna-se ainda mais comprido. A propósito, o físico Paul Davies escreveu o seguinte: "As distorções mútuas do espaço e do tempo podem considerar-se como uma conversão do espaço (que encolhe) em tempo (que estica). Um segundo de tempo, no entanto, equivale a uma enorme quantidade de espaço - cerca de 186.000 milhas" (Deus e a Nova Física; Edições 70; pág.133).

Talvez essa conversão de espaço em tempo corresponda à conversão de massa em energia (o fóton, para o qual o tempo acha-se infinitamente dilatado, não possui massa intrínseca.)

É, muita coisa para se pensar...

[ ]'s
Manuel Bulcão

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