Alberto Mesquita Filho
Editorial - Integração V(16):3-4,1999
And God created the Net and saw it was good. So he created Newsgroups, and said
"go forth and multiply".
Alex Lopez-Ortiz, 1998 (*)
A Usenet foi iniciada em 1979, na Carolina do Norte (USA), como uma experiência
acadêmica. A idéia era criar um quadro de avisos eletrônico para facilitar o trabalho de afixar e
ler os avisos e as notícias. No início só havia duas instalações na rede: Universidade da Carolina do
Norte e a Duke University.
Harley Hahn & Rick Stout, 1994
(**)
A Usenet, fruto de um trabalho desenvolvido em 1979 pelos alunos da Duke
University e da Universidade da Carolina do Norte, teve, como finalidade
inicial, prover as comunidades de origem de mais um meio de comunicação, via
de regra relacionado a assuntos pertinentes à extensão universitária. Nada
mais era do que um "quadro de avisos flutuante" (FALK, 1997)
(1). Seu
crescimento, tímido na época, atingiu na atualidade um caráter vertiginoso,
escapando das orbes acadêmicas e ganhando domínio público. Na universidade é
visto, hoje, como de importância secundária. A história se repete; e, como
diria Thomas Khun, alguns períodos de "ciência normal" serão necessários, a
fim de que novas gerações de universitários deixem de lado os dogmas ora
vigentes e proponham, com sucesso, novos paradigmas, a colocarem a
universidade frente aos padrões emergentes exigidos pela infoera.
A Usenet popular compõe-se das chamadas hierarquias (agrupamentos de
newsgroups, ou grupos de discussão, relacionados a uma certa área do
conhecimento). As hierarquias principais são: alt (alternativa), bionet
(biologia), comp (computadores), k12 (educação até o 2.o grau), news
(Usenet), rec (diversão), sci (ciência) e soc (questões sociais), dentre
outras. Existem ainda hierarquias menores, relacionadas a países (ar, aus,
br, brasil, chile, de, es, fr, it, peru, mx, etc), a empresas (microsoft,
netscape, corel, etc) e a universidades (até o momento eu tenho catalogadas
168 hierarquias universitárias de acesso público, correspondendo a 9.078
grupos de discussão).
Ainda que de importância secundária, a Usenet universitária não é mais vista
como um mero quadro eletrônico de avisos (oferta de empregos, compra e venda
de livros usados, notificação de eventos, etc.), nem mesmo como uma
ferramenta a atender, exclusivamente, aos princípios relacionados à extensão
universitária. Existe, já, a idéia de "Grupos de Discussão", conquanto se
conserve a denominação inicial newsgroups (grupos de notícias ou de avisos).
Existe, também, a noção de interatividade, a consagrar o velho ditado
popular a pregar que duas cabeças pensam melhor do que uma. E existe, ainda,
o caos, a mostrar que é muito difícil sintetizar o que pensam milhões de
cabeças.
Algumas universidades —e não estou aqui me referindo apenas às
"universidades virtuais"— têm tentado criar Grupos de Discussão em apoio a
atividades de ensino. Percebe-se uma certa frustração neste setor, pois não
existem ainda normas pedagógicas a serem seguidas, ficando o sucesso da
empreitada à mercê de crenças pessoais. Desta forma, alguns professores
conseguem, durante um certo tempo, criar uma certa euforia, ficando difícil
saber até que ponto o interesse demonstrado pelos alunos relaciona-se à
disciplina ministrada ou à inovação metodológica. De qualquer forma,
percebe-se o quanto a Usenet pode ser útil em preencher o espaço antigamente
devotado à obsoleta "lição de casa" ou, então, a aproximar os alunos em suas
dúvidas e/ou discussões.
Se, por um lado, a Usenet universitária apresenta uma contribuição razoável
à Extensão e, em menor grau, ao Ensino, à Pesquisa fica a nos dever sua
participação de fato. E, a conservarmos o modelo tradicional de avaliação
(de papers) pelos pares, que tem como único benefício o de evitar o caos
informacional e, como estratégia, a de filtrar conceitos a contrariarem os
dogmas ou paradigmas vigentes, permaneceremos neste estado por muito tempo.
Indiferente ao modelo universitário, a Usenet pública, não universitária,
vem ocupando um espaço de fazer inveja a qualquer educador de décadas
passadas. É imenso o contingente de estudantes das melhores universidades a
se dirigirem a grupos leigos, solicitando informações sobre temas que, em
épocas recentes, somente seriam discutidos em salas de aula. Bem ou mal,
percebe-se que estes estudantes têm, graças à Usenet, aprendido muito sobre
assuntos vários, tais como evolucionismo, teoria da relatividade, filosofia,
cálculo, botânica, etc. E o interessante é verificar que, não importa quão
complexo seja o tema, ou quão ingênuo seja o questionamento, sempre há
alguém disposto a discutir o assunto, a fornecer uma pista, um link ou uma
dica; ou então a exportar vários megabytes de textos escritos por terceiros;
ou mesmo a se solidarizar com a idéia apresentada. E é graças a isso que a
legião dos internautas, adeptos da Usenet, não pára de crescer.
A.M.F.