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Dezembro de 1999

Considerações Sobre Irreversibilidade e Entropia

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As mensagens 33 a 41 foram postadas na Ciencialist ou no News uol.ciencia, e refletem uma discussão paralela que se seguiu após as mensagens 01 a 18 terem sido apresentadas no eCC.

Ciencialist msg33
De: Alberto Mesquita Filho
Data: Quarta-Feira, 22 de Dezembro de 1999

Neville (mensagem 31) escreveu:

Neville: Há alguns pontos importantes que não se pode perder de vista. Antes de tudo, a Termodinâmica é uma excelente ferramenta para cálculo, mas, pouco explica a natureza dos fenômenos fundamentais.

Concordo plenamente. Aliás, diria que não é pretensão da termodinâmica explicar a natureza dos fenômenos fundamentais. Por opção de seus autores (do século passado), é uma teoria fenomenológica ou behaviorista ou de caixa-preta. Para os cientistas realistas, como Einstein, Mário Bunge, Mário Schenberg, dentre outros, "o fim último da teorização científica é edificar teorias representacionais que abarquem e expliquem as correspondentes teorias fenomenológicas".

Não obstante, se a termodinâmica ainda é hoje o paradigma das teorias fenomenológicas, conquanto tenha sido formulada há mais de 150 anos, isto se deve única e exclusivamente à falácia das teorias que tentaram substituí-la, incluindo a mecânica estatística, a mecânica quântica, as termodinâmicas dos processos irreversíveis, etc. E apesar do pouco que explica, a termodinâmica, nos seus 10 primeiros anos de existência, trouxe mais frutos para a ciência, cultura e tecnologia ocidentais do que a mecânica quântica e a relatividade juntas durante todo o século XX.

Neville: Alem disso, as leis termodinâmicas, especialmente a 3a. (do aumento da entropia)...

Apenas para que os demais entendam, diria que a "3a. lei", considerada como a "do aumento da entropia", é aquela que os livros didáticos citam como 2a. lei, posto que atribuem o princípio do equilíbrio térmico como lei zero ou lei zerogésima. A meu ver, você está correto e ainda mais por tomar o cuidado de acrescentar o entre parêntesis identificador.

Neville: ...são aplicáveis a sistemas macroscópicos em seu estado de maior probabilidade (o que quase é uma tautologia).

Com efeito. Diria apenas que o caráter tautológico pertence à mecânica estatística e não à termodinâmica.

Neville: Isso implica em sistemas homogêneos ou que ao menos tenham "fases" (regiões limitadas por uma superfície) macroscopicamente homogêneas. Disso, imediatamente segue a necessidade do conceito de "equilíbrio" local, o qual, se realmente ocorresse a nivel microscópico, produziria um universo estático ou estagnado, ou talvez, no máximo, em "estado cristalizado". Alias, o critério para que um sistema (ou parte dele) seja considerado macroscopico é justamente esse - ele deve ser suficientemente grande para que a medição das suas propriedades não apresentem "oscilações" maiores que os erros de mediçao.

Isso é comum em ciência. Quando o astrônomo diz que o Universo é homogêneo ele está aceitando os mesmos critérios que os químicos aceitam ao conceber que uma solução é homogênea. A esse respeito costumo utilizar o que chamo Teorema da Indeterminação: Ao se estudar uma população heterogênea pela utilização de propriedades populacionais (e não individuais), os valores individuais obtidos estarão sempre sujeitos a um fator de incerteza diferente de zero, independente da precisão e/ou exatidão do método, e dependente do grau de heterogeneidade da população em estudo. Trata-se de um teorema tão óbvio quanto desconhecido.

Neville: Por outro lado, o 3o. princípio (o do aumento da entropia) é frequentemente "violado" a nível microscópico, (sínteses enzimáticas - clorofila, duplicação cromosssômica, seleção microbiológica na fermentação de açúcares L-D, seletividade de membranas celurares, absorções quânticas seletivas, etc. etc.)

Talvez as conclusões da mecânica estatística se enquadrem nesta violação. Quanto às leis da termodinâmica, sinceramente não sei se alguém já conseguiu expandi-las para o nível microscópico sem despersonalizar a termodinâmica como tal.

Neville: Mesmo dentro da TPI (termod. de proc. irreversíveis) ocorreu uma polêmica (falsa, a meu ver) envolvendo dezenas de estudiosos e experimentadores, a qual durou mais de uma década. Começou com um artigo publicado por Beenson e Yostem, em 1927, apontando a ocorrência de algumas reações químicas com diminuição intrínseca de entropia dentro de um sistema com reações simultâneas. Essa fenomenologia, que já fora observada por Rysselberg, foi chamada de Acoplamento Químico (AQ).

Aí já concordo, pelo menos em teoria, contigo. Aliás, creio que existem sistemas bem mais simples (também relacionados a processos irreversíveis em sistemas compartimentalizados - e a reação química não deixa de ser um sistema compartimentalizado) onde a termodinâmica clássica se dá mal. O problema é que nenhuma das teorias dentre as que estão por aí, pretensamente a substituirem a termodinâmica, acrescentam alguma coisa de útil.

Quanto ao Acoplamento Químico...? Não seriam condições em que elétrons (ou, até mesmo, prótons) saltariam de uma molécula para outra seguindo algo semelhante às "órbitas permitidas de Bohr"? É de se notar que sempre que ocorre algo do tipo, ou seja, sempre que o elétron encontra uma "macro-órbita permitida", como por exemplo, em supercondutores, nos quais ele é acelerado sem emitir energia radiante, alguma coisa reflete-se nos fundamentos da termodinâmica, a ponto de "ficarmos no ar". É de se notar também que essas "macro-órbitas" são regiões de "confinamento adiabático", o que se traduz pelo caráter reversível do processo que as utiliza (embora o processo como um todo possa ser irreversível).

Neville: O conceito de entropia (que é uma propriedade de estado) é um tanto abstrato e está associado à idéia de que o sistema, quando perturbado, evolui para a situação de maior entropia, isto é, aquela em que é estatisticamente mais provável que ele seja observado (óbvio), probabilidade essa que seria um indicador da "desordem" do sistema.

A noção de desordem retrata um representacionismo não muito coerente com a filosofia da termodinâmica.

Neville: Em geral, o equilíbrio de sistemas na Termodinâmica Química, é mais convenientemente estudado usando-se a função "energia livre" (introduzida por Gibbs). O conceito de que "um sistema evolui para um estado de menor energia livre", convenhamos, é bem mais deglutível; aliás, estatisticamente é até óbvio, pois a enegia livre é definida de forma semelhante a um "poço" de potencial.

Com efeito, a termodinâmica possui propriedades de estado em excesso, porém isso se deve a sua generalidade. Em determinadas condições, trabalha-se melhor com a energia livre de Gibbs (G); em outras, com a energia livre de Helmholtz (A); e há muitos casos em que a entropia (S) se justifica como a propriedade mais deglutível. Assim como, em determinados casos, podemos deixar a energia interna (E) de lado e utilizar a entalpia (H), podemos também deixar S de lado e utilizar G ou A. Aliás, tais grandezas são facilmente convertíveis umas nas outras, através das expressões:

H = E + pV
A = E - TS
G = H - TS.

Neville: Quando se raciocina a nível de interações elementares a termodinâmica perde o sentido; falar de "temperatura" de um único átomo ou partícula ou então de uma massa gasosa muito rarefeita no espaço inter-estelar - seria apenas uma figura de linguagem para indicar a velocidade translacional ou talvez a quantidade de movimento das partículas ou ainda para estabelecer uma comparaçao com frequências de onda emitidas.

Da mesma forma que é sem sentido falar do pH da mitocôndria. Não obstante, sabemos pela teoria quimiosmótica que existe um transporte de H+ através da membrana mitocondrial em obediência a um gradiente protonmotriz, mecanismo esse responsável pela produção de ATP. Por outro lado, qual é o pH de uma molécula de água?!!! Não tem sentido, da mesma forma que não tem sentido falar de temperatura de uma partícula.

Neville: O resultado de um balanço global da entropia no universo talvez não faça qualquer sentido; assim, o uso da termodinâmica se limitaria a sistemas macroscópicos fechados, mas não muito extensos.

Realmente. Também acho que essa idéia de entropia do Universo seja uma extrapolação sem sentido. Aliás, em todos os casos práticos, quando se fala no "resto do Universo", em contraposição ao sistema objeto de estudo, entenda-se: um sistema de dimensões bem maiores do que o sistema estudado e tal que algumas de suas propriedades (p e T, principalmente) possam ser consideradas praticamente constantes apesar das interações. "Resto do Universo", portanto, do ponto de vista da termodinâmica, nada mais é do que o meio ambiente nas proximidades do sistema estudado.

[ ]'s
Alberto
Ciencialist msg34
De: Joao Carlos Holland de Barcellos
Data: Quarta-Feira, 22 de Dezembro de 1999

Roberto Mitsuo Takata (mensagem 30) escreveu:

Roberto: de qq forma, observacoes atuais sugerem q. nao precisamos nos preocupar com um big-crunch ou um universo q. um dia pare de 'inflar'... a expansao seria continua...

Esta observações são recentes? Uma vez li que tal estimativa (da possível contração do Universo) estaria relacionada a massa do neutrino.

[]s
jocax
Ciencialist msg35
De: Luis Roberto Brudna
Data: Quarta-Feira, 22 de Dezembro de 1999

Roberto Mitsuo Takata (mensagem 22) escreveu

Roberto: e aqui especulacao de leigo (os fisicos podem dizer se estou dizendo muita bobagem) - as transformacoes e evolucao dos sistemas estao ligadas a questao da entropia q. por sua vez estah ligada aa expansao do universo. ou se o universo fosse estatico teriamos todo esse fenomeno (ou outro qq) de transformacoes?

Tak.. estou concordando com o que vc estah dizendo e esta sua pergunta... eh realmente interessante. Jah me passou pela cabeca e nao consegui resposta. :) Alias... eu deveria me meter nesse assunto.. entropia... pois estah relacionado com minha area de atuacao aqui na pesquisa, mas estou sem tempo. :/

Algumas respostas podem estar nos estudos de termodinamica de processos irreversiveis... que eh um assunto pesado, como jah disse uma vez. :)

Ateh mais.
Luis Roberto B
Ciencialist msg36
De: Roberto Mitsuo Takata
Data: Quarta-Feira, 22 de Dezembro de 1999 12:50
Roberto (mensagem 30): com um big-crunch ou um universo q. um dia pare de 'inflar'... a expansao seria continua...
Jocax (mensagem 34): Esta observações são recentes?

sao, acho q. deste ano ou do ano passado... aih comecaram algumas especulacoes em cima: a gravidade seria repulsiva a grandes distancias, etc...

qto aos neutrinos tbm ouvi falar q. se eles tivessem massa (existem alguns detectores de neutrinos gigantescos por aih) poderiam ser os principais elementos da materia escura...

mas como essas informacoes foram via imprensa nao sei quao bem elas refletem o estado da arte da cosmologia/astrofisica... (quem eh da area sabe a qtdade de besteiras publicadas: ateh hoje nao me esqueco do peixe com patas tao parecido com um girino q. na verdade era um girino, mas enfim...)

aproveitando um otimo natal a todos - mesmo para os q. nao sao cristaos: votos ecumenicos de felicitacoes nao fazem mal algum, fazem? e boa virada de ano (de preferencia sem o tal bug).

[ ]s,
roberto takata
msg37
De: Michelle
Para: News uol.ciencia
Data: Quarta-Feira, 22 de Dezembro de 1999

Alberto Mesquita Filho escreveu:

Alberto: Em caso de dúvidas poderei respondê-las aqui no "uol.ciencia"

Oi Alberto,

Como disse o André na sua primeira mensagem:

a prova de Termodinâmica já passou, fiz e não entendi quase nada!

Eu pude ver o tanto que os físico-químicos valorizam essa parte da matéria! heheh. Bom, de qualquer jeito será uma ótima oportunidade para tentar entender um pouquinho mais sobre isso. Ainda não consegui ler tudo, mas até então, gostei muito.

[ ]´s
Michelle
msg38
De: Alberto Mesquita Filho
Para: News uol.ciencia
Data: Terça-Feira, 21 de Dezembro de 1999

Michelle escreveu na mensagem 37:

Michele: Bom, de qualquer jeito será uma ótima oportunidade para tentar entender um pouquinho mais sobre isso. Ainda não consegui ler tudo , mas até então, gostei muito.

Olá, Michelle

Grato pelos comentários favoráveis. Não era minha intenção inicial mas a brincadeira didático-pedagógica evoluiu de tal forma que estou pensando em apresentá-la num Simpósio (que acontecerá em Outubro/2000 na USJT e que terá como tema central "Educação a Distância") juntamente com os demais artigos que coloquei na seção "Diálogos Usenet" de meu Web Site, e que relata muita coisa acontecida aqui no uol.ciencia. A escola do futuro tem muito a ver com isso: é um "aprender numa boa", é um "viver aprendendo e ensinando" ou "aprender ensinando" ou, ainda, "ensinar aprendendo". E a Internet faz parte dessa escola. É uma pena que apenas 3% dos brasileiros têm acesso à Internet. Como também, é uma pena que a grande maioria dos professores universitários brasileiros relute em aceitar a Internet como um órgão de efetiva comunicação científica e não apenas para seus pares (o que será feito através da Internet 2) mas, e principalmente, para todos aqueles que querem aprender e/ou reciclar seus conhecimentos. O professor que aprender a dominar a máquina jamais será substituído pela máquina.

[ ]'s
Alberto
Ciencialist msg39
De: Neville
Data: Sexta-Feira, 24 de Dezembro de 1999

Alberto

Fico-lhe muito agradecido por seus sempre atentos comentários (mensagem 33). O "Teorema da Indeterminaçao" merece um quadro na parede. Muita perda de tempo seria evitada se ele fosse adequadamente considerado.

Alberto: Talvez as conclusões da mecânica estatística se enquadrem nesta violação.

A fundamentação da teoria termodinãmica a partir da mecânica estatística, mais me parece um belo exercício de matemática - tem lá os seus encantos - mas se mostrou incompleta e foi incompetente como tentativa de contruir teoria unificadora (particularmente da relaçao da química com a física); bem ao contrario, aumentou a hibridez na fundamentação termodinãmica.

Alberto: Quanto às leis da termodinâmica, sinceramente não sei se alguém já conseguiu expandí-las para o nível microscópico sem despersonalizar a termodinâmica.

Também concordo. A meu ver, a expansão do campo de aplicaçao de uma teoria implica na introduçao de novas restrições (perdas) de conteúdo ou quando muito apenas em sua conservação. Desconheço se há caso contrário. Apenas para ilustrar o sentido da afirmação "perda de conteúdo", imagine se uma teoria sociológica humana e uma teoria sociológica para formigas (seja lá o isso possa ser) . Uma teoria que fosse válida para ambas as sociedades teria como conteúdo apenas a parte em comum, (a intersecção das duas) sendo portanto bem mais restrita.

Navegando ainda em abstraçoes: (as analogias são perigosas mas, às vezes são ótimas para comunicar idéias.) Comparo a teoria termodinâmica e seus elementos microscópicos com a Sociologia e os indivíduos e argumento: "Uma boa teoria sociológica deveria ser suficientemente completa para permitir deduzir as propriedades características dos indivíduos" ou, em outros termos, "deveria permitir que dela fosse deduzida a psicologia". Me parece fácil ententer que tal teoria não exista, ou, existindo, seria totalmente descaracterisada como sociologia". O oposto parece mais viável. Uma teoria psicológica "boa" seria suficiente para derivar uma teoria sociológica. Mas, será que é possível existir uma tal teoria?, ou será que teriamos que criar uma teoria fisiológica "boa" que permitisse deduzir uma teoria psicológica "boa", que então produziria uma teoria sociológica. Bem, a cadeia assim contruída fatalmente acabaria a vala comum dos constituintes fundamentais do universo. Desse modo, parece não ser conveniente fundamentar uma teoria em outra a menos que esta se mostre comprovadamente "boa". Não sei se falo bobagem, mas me parece que nem a mecânica quântica - e mesmo a teoria da relatividade - são suficientemente "boas" nesse sentido. Aliás, pensando nestes termos, também não sei se há chance de poder existir uma teoria unificadora fundamental, a partir da qual fosse possível deduzir as demais.

[s]
neville
Ciencialist msg40
De: Luiz Ferraz Netto
Data: Sexta-Feira, 24 de Dezembro de 1999

Nevile escreveu na mensagem 39:

Neville: Comparo a teoria termodinâmica e seus elementos microscópicos com a Sociologia e os indivíduos e argumento: "Uma boa teoria sociológica deveria ser suficientemente completa para permitir deduzir as propriedades características dos indivíduos" ou, em outros termos, "deveria permitir que dela fosse deduzida a psicologia". Me parece fácil ententer que tal teoria não exista, ou, existindo, seria totalmente descaracterisada como sociologia".

Essa observação entre aspas (acima), suscita a teoria cinética dos gases; ela pode produzir leis gerais de comportamento (Boyle-Mariotte-Gay-Lussac etc.) mas não rege o comportamento individual de cada molécula (indivíduo). Isso faz lembrar o 'bom doutor' e sua psicohistória (que, acreditem ou não é matéria acadêmica em muitas universidades do USA). Toda a psicohistória de Asimov é baseada na teoria cinética dos gases. Ele associa indivíduo com molécula e, como a teoria cinética exige uma enorme (brutal) quantidade de moléculas para funcionar, e como não havia tantos indivíduos na Terra, Asimov foi obrigado a desenvolver a idéia de 'Império Galático' só para conseguir o número de indivíduos para que a psicohistória tivesse base lógica. Essa psicohistória seria uma teoria sociológica ... e jamais seria suficiente para permitir deduzir as propriedades características dos indivíduos.

[ ]'s
Léo
Ciencialist msg41
De: Alberto Mesquita Filho
Data: Sexta-Feira, 24 de Dezembro de 1999

Olá Neville

Gostei do caráter multidisciplinar de seus comentários (mensagem 39). Há muito tempo venho tentando provar para mim mesmo que o método científico é comum a todas as ciências, mas sempre acabo esbarrando com questiúnculas que não sei se têm razão de ser ou apoiam-se em preconceitos. O problema do tentar generalizar propriedades populacionais para situações individuais encaixa-se nesta condição. Como, via de regra, a generalização leva a falácias, principalmente nas ciências humanas, conclui-se que o "método" deixa a desejar. O interessante, no entanto, é que, como foi apontado em nossas mensagens anteriores, este tipo de generalização também não se justifica nas ciências naturais, a menos que como idealizações lógico-analógicas.

Com respeito à fragilidade das teorias, creio que não há nada de mais belo na literatura do que o duelo travado entre Einstein e Bohr. Para os que NÃO entenderam a discussão, estava em jogo o "realismo de Einstein" versus o "utilitarismo de Bohr". Não obstante, a realidade era bem outra. Tanto Einstein quanto Bohr sabiam que, via de regra, não se mexe nos pilares de uma teoria (hipóteses) sem despersonalizá-la totalmente (principalmente se a teoria tiver sido construída em terreno infértil, o que, sabe-se hoje, era o caso, tanto da relatividade quanto da física quântica - teorias que iam contra o senso comum). E o problema fundamental é que ambos sabiam que teoria da relatividade e teoria quântica eram incompatíveis (hoje, sessenta anos após, qualquer físico sabe isso), e não havia meio de compatibilizá-las sem despersonalizar uma ou ambas as teorias.

Sempre que Einstein descobria uma falácia na mecânica quântica, Bohr, muito sutilmente, aceitava provisoriamente as consequências desta falácia e construía um contra-argumento a mostrar para Einstein que, se o seu raciocínio estivesse correto, a teoria da relatividade também não iria resistir à crítica apontada. E Einstein, para utilizar uma conotação popular, enfiava a viola no saco e partia para a construção de novos experimentos imaginários a refutarem a teoria quântica. E a história se repetia, até que os dois, cansados de se contra-argumentarem sem chegar a nada, tomaram caminhos divergentes; e nunca mais se defrontaram até o final de suas vidas.

Neville: Navegando ainda em abstraçoes: (as analogias são perigosas mas, as vezes são ótimas para comunicar idéias.)

"Navegar é preciso."

Neville: Desse modo, parece não ser conveniente fundamentar uma teoria em outra a menos que esta se mostre comprovadamente "boa". Não sei se falo bobagem, mas me parece que nem a mecânica quântica - e mesmo a teoria da relatividade - são suficientemente "boas" nesse sentido.

Foi o que tentei mostrar acima através de argumentos históricos.

Neville: Aliás, pensando nestes termos, também não sei se há chance de poder existir uma teoria unificadora fundamental, a partir da qual fosse possível deduzir as demais.

Só o tempo responderá.

[ ]'s
Alberto

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