Integração Ensino-Pesquisa-Extensão (*)

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Alberto Mesquita Filho (**)
Integração III(9):138-43,1997

 

 

1. Introdução

Qualquer semelhança entre o tema da minha fala e o título da revista do Centro de Pesquisa da Universidade São Judas Tadeu, não é mera coincidência. Com efeito, Integração ensino-pesquisa-extensão é uma das metas perseguidas por nossa equipe e, como tal, consta de nossa carta de intenções (1).

Chega a ser paradoxal eu me propor a falar sobre integração de objetos indissociáveis, como dá a entender o tema desta mesa redonda. O paradoxo, no entanto, se resolve se pensarmos no conceito de princípio não como algo meramente estático, inerte e absoluto, mas como uma bússola a nos guiar ou nos orientar na vastidão de nossa existência.

Tomemos, por exemplo, o princípio da inércia; um corpo, livre da ação de forças, uma vez em movimento, permanece indefinidamente em movimento retilíneo e uniforme. Qualquer físico aceita esta verdade, mesmo sabendo que não há, neste universo, lugar algum onde um corpo possa estar livre da ação de forças. E nós sabemos que, a exceção dos corpos celestes, que não estão em movimento retilíneo, todos os demais corpos em movimento tendem a parar.

O que o princípio da indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão pretende nos garantir é que, se nos aproximarmos deste ideal, estaremos próximos da perfeição. Ou seja, a universidade será tão mais eficiente, no cumprimento de seus objetivos nobres, quanto mais associados estiverem seus componentes básicos. Uma vez que acreditamos neste princípio, espero ter justificado nossa procura por este ideal.

2. Definições e/ou conceitos vulgares de extensão

Se fizermos uma enquete, entre universitários, sobre o que é ensino ou o que é pesquisa —por exemplo, neste auditório— acredito que quase todos os entrevistados acabarão por falar alguma coisa. Alguns irão falar com mais propriedade, outros com menos, mas todos dirão alguma coisa: todos têm noção do que seja ensino ou do que seja pesquisa. No entanto, se num meio universitário qualquer perguntarmos o que é extensão universitária, muitos não irão saber nem do que se trata, embora as pessoas tenham, intuitivamente, e dentro delas, o conceito. Eu, por exemplo, fui extensionista durante onze anos [de 1969 a 1979], e só fui descobrir isso há poucos anos. Ou seja, eu era extensionista e não sabia. Não estou colocando esta ignorância como uma falha pessoal: como vimos, a pessoa pode até mesmo agir na área da extensão e saber intuitivamente o seu significado, sem no entanto utilizar-se da palavra extensão.

Graças a essa dificuldade, inerente ao meio universitário brasileiro, eu fiz um discreto levantamento bibliográfico. A literatura sobre extensão é muito reduzida, e se a formos comparar com as correspondentes literaturas sobre ensino ou pesquisa, ela é praticamente nula, ou seja, desaparece no meio destas últimas. Mas existe alguma coisa a respeito e, desta forma, eu consegui tabular dezenove conceitos diferentes de extensão universitária. A maioria destes conceitos foram obtidos pela leitura do livro de Botomé (2) (1996) que foi Pró-Reitor de Extensão da Universidade Federal de São Carlos. Esses 19 conceitos, a que eu chamaria conceitos vulgares de extensão, foram divididos em cinco categorias:

2.1 A extensão como curso;
2.2 A extensão como prestação de serviços;
2.3 A extensão como complemento;
2.4 A extensão como "remédio";
2.5 A extensão como instrumento político-social.

Todos aqueles que aceitam uma ou outra destas categorias, referem-se às mesmas como conceituação do que acreditam seja extensão universitária. Vejamos, então, e rapidamente, quais são estes dezenove conceitos vulgares assim classificados.

2.1 A Extensão como Curso:

2.1.1 Aproximação com a população para ilustrá-la: Esse conceito chegou a ser utilizado na Europa, no fim do século passado, e foi este o conceito importado para o Brasil, chegando aqui com a conotação de curso;

2.1.2 Cursos variados: A utilizarmos este conceito, qualquer curso dado dentro da universidade, que não os cursos de graduação, estariam inseridos no contexto da assim caracterizada extensão universitária. Percebam que, a aceitarmos esta conceituação, o que diferencia o ensino da extensão nada mais é que o vestibular.

2.1.3 Cursos de extensão: Aqui já se nota uma tentativa de regulamentação do conceito anterior através de, por exemplo, uma carga horária.

2.1.4 A legislação de 1931 tipifica a extensão como curso: À extensão cabe: divulgar as atividades técnicas e científicas da universidade através de cursos e conferências [Dec. 19.851 de 11/4/31].

2.1.5 Complementando a legislação de 1931, a lei 4024 caracteriza a extensão como modalidade de curso.

2.2 A Extensão como Prestação de Serviço

2.2.1 Enquanto a extensão como curso apoiou-se em idéias importadas da Europa, ainda que interpretadas à nossa maneira, dos Estados Unidos importou-se a idéia de extensão como prestação de serviços sociais, adotada, nos EUA, também no final do século passado, chegando aqui de uma maneira talvez diversa da original, ou seja, sem vínculos com o ensino e a pesquisa. Desta forma, a prestação de serviços sociais, sem vínculos com o ensino e a pesquisa seria, de acordo com alguns autores, extensão universitária.

2.2.2 Outros que pensam na mesma linha, consideram a extensão como instrumento de apoio a mudanças sociais; este item poderia ter sido classificado na última categoria citada (extensão como instrumento político-social - 2.5), estando aqui apenas para que se confronte com o anterior, mostrando que ele se insere num contexto um pouco mais amplo.

2.2.3 Promoção de eventos. Qualquer tipo de evento acontecido na universidade seria, desta forma, encarado como extensão.

2.2.4 Atividades filantrópicas.

2.2.5 Qualquer tipo de relação [extra-cursos] entre a universidade e a comunidade. Amplia-se aqui o conteúdo das duas categorias anteriores. Quero crer que o pregador desta idéia apenas por lapso tenha deixado de excluir a pesquisa dentro do que chama extensão.

2.2.6 "Comunicação" com a sociedade. Esta caracterização da extensão é referida a Paulo Freire (1971). Eu coloquei comunicação entre aspas posto que precisamos interpretar o que seria essa comunicação antes de efetuarmos qualquer crítica ao conceito, mesmo porque não cheguei a ir até a fonte da citação. O comentário a respeito do conceito de Paulo Freire, contido na fonte consultada, considera tão somente a universidade indo estudar a população com a finalidade de verificar quais os interesses da população com relação a determinado serviço a ser prestado in loco pela universidade. Não seria, portanto, uma simples prestação de serviços, mas uma prestação de serviços onde houvesse uma busca dos interesses daquela população. Não sei se Paulo Freire pára por aí, mas vejo a comunicação como um conceito bipolarizado. Se existem os interesses da sociedade, devemos também considerar os interesses da universidade. Ou seja, o que, em contrapartida, a universidade recebe deste possível benefício prestado à comunidade? Essa extensão está melhorando o ensino da universidade? Está melhorando o setor de pesquisa? Não estou falando aqui em recursos financeiros, mas referindo-me à universidade como um todo. De nada adiantará à universidade prestar um serviço que não promova um retorno, a menos que aceitemos o conceito de extensão como filantropia, mas isto qualquer empresa pode fazer, descaracterizando assim a extensão como uma atividade inerentemente universitária; por outro lado, não havendo um retorno, a extensão perde a sua essencialidade.

2.2.7 Muito próximo da idéia de Paulo Freire, temos o projeto Rondom. Não vou entrar em detalhes, mas lembrar apenas que se trata de um projeto multiuniversitário inserido no contexto do que estamos discutindo.

A fim de ilustrar essa idéia de extensão como prestação de serviços, e mostrar o quanto ela é atual, eu trouxe este texto publicado na Folha de São Paulo de hoje (3):

Chega a ser surpreendente, em vista disso, que num contexto de tão extrema juventude, algumas das instituições universitárias brasileiras, especialmente por terem sabido conjugar o ensino superior com a pesquisa e a prestação de serviços, tenham atingido um patamar de produtividade que a maioria de nossas irmãs latino-americanas ainda persegue.

2.3 A Extensão como Complemento

2.3.1 Decreto Lei 252 de 28/2/67: A universidade deverá estender à comunidade, sob a forma de cursos e serviços, as atividades de ensino e pesquisa que lhe são inerentes. O que há de diferente é que o decreto propõe que a universidade leve à comunidade, através de cursos e serviços, o produto de suas atividades essenciais, que estariam assim restritas ao ensino e à pesquisa. Ou seja, a extensão seria apenas um complemento, e não uma atividade primordial, básica e essencial da universidade. Em outras palavras, a extensão não seria autônoma, não tendo existência por si só, mas sim como complemento de ensino e pesquisa que seriam, desta forma, as atividades fundamentais da universidade.

2.3.2 Meio para colocar ao alcance da comunidade os resultados das atividades de ensino e pesquisa. Isso é da legislação de 1968, caracterizando também a extensão como um complemento.

2.3.3 Processo que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação transformadora entre universidade e sociedade. Essa definição foi estabelecida pelos Pró-Reitores de extensão em 1987, e eu quero crer que após isso eles, por coerência, devem ter pedido demissão de seus cargos, posto que admitiram a extensão como um complemento a articular atividades afetas a outras Pró-Reitorias, atribuição esta que, quero acreditar, deva pertencer ao Reitor.

2.3.4 Processo pelo qual se amplia o acesso ao conhecimento, já acessível pelas atividades de ensino formal.

2.4 A Extensão como "Remédio"

2.4.1 Extensão é a "compensação" destinada a suprir as falhas do ensino regular, como por exemplo o alheamento da realidade dos problemas sociais. Então, vejam: se algo anda mal com o ensino, o que se propõe não é a cura pela raiz, mas tão somente que se remedeie a falácia apontada através de alguma manobra compensadora, aqui considerada como atividade de extensão. Isto é o que em medicina se denomina tratamento sintomático: trata-se o sintoma, mas não a doença.

2.5. A Extensão como Instrumento Político-Social

2.5.1 Instrumento utilizado pelo Estado para manter a ordem vigente.

2.5.2 "Trincheira dos revolucionários" nas universidades, agrupamento de pessoas mais "progressistas" das universidades.

Têm-se, aí, as versões da direita e da esquerda correspondentes a uma época superada de nossa história, ainda que recente.

Eu procurei dar uma ênfase introdutória à extensão apenas para tentar produzir um nivelamento com relação aos outros termos, ensino e pesquisa, que julgamos conhecer. Se ao início da palestra algum dos presentes não tinha noção do que é extensão, agora acredito ter conseguido promover uma confusão geral a respeito do tema, de forma que poderemos prosseguir em pé de igualdade com os demais conceitos.

macrométodo científico3. O macrométodo científico

Vamos conceituar, de maneira bem geral, o que seja pesquisa, através de um gráfico que representa o que costumo chamar por macrométodo científico. Fala-se muito em método científico, mas eu costumo caracterizar um macrométodo, um método propriamente dito, e um terceiro elemento a que eu tenho chamado por micrométodo científico. Vou aqui considerar método como um caminho, e, portanto, método científico é o caminho trilhado pelo cientista quando exerce a sua atividade (figura 1).

Por onde começa a atividade científica? Suponhamos que um cientista tenha publicado seus resultados, ou seja, tenha completado uma etapa da sua existência como tal. Que fazer a seguir? Uma possibilidade seria estudar algum tema novo; outra seria aprofundar-se em algum tema de seu interesse. De qualquer forma, ele provavelmente vai entrar agora numa fase de aquisição de conhecimentos, visando à criatividade. Então ele vai começar a estudar, visando a obter um insight. Enquanto ele está estudando, debatendo, discutindo em grupos de estudo, de repente ele tem um estalo ou insight, ou seja, torna-se possuído por uma intuição. Com grande frequência esta intuição relaciona-se apenas superficialmente com o tema escolhido para estudo, e em menor grau aparenta estar totalmente dissociada do mesmo, condição que o leigo atribui ao acaso. Percebam que os tratados que discorrem sobre método científico frequentemente evidenciam uma lacuna exatamente no momento em que deveriam descrever com propriedade a intuição. E, com efeito, é muito difícil encaixar a intuição no método científico, pois o método científico é muito axiomático, e não é fácil axiomatizar a intuição. Como é que se ensina um indivíduo a ter intuição? É difícil. Nós podemos saber como a escola inibe a intuição das pessoas, mas dificilmente conseguiremos uma receita infalível para tornar as pessoas mais intuitivas. Consequentemente, a intuição não aparece no método científico. Vemos aí a indução, a dedução, a análise e a síntese.

macrométodo científico 2Alguns acham que a ciência é indutiva, outros dedutiva, mas a intuição é sempre relegada a um segundo plano. E, em verdade, ela antecede ao método científico, e é por esse motivo que a considero como pertencente ao macrométodo científico (figura 2).

Depois que o cientista teve o estalo, ou o insight, ele caminha no sentido de realizar uma pesquisa: ele vai projetar a pesquisa, o que está representado na figura 2 como uma flecha que culminaria na elaboração de novos conhecimentos. Se aplicássemos um zoom no lado direito da figura, seria então de se esperar que visualizássemos, na mesma, o método científico: o caminho percorrido pelo cientista entre a intuição e a conclusão dos trabalhos daí decorrentes.

Chegando a uma conclusão, o cientista irá publicar os resultados, irá apresentá-la em um congresso, irá submetê-la a discussões, etc. Essa etapa está representada na figura 2 como difusão. E, terminado o trabalho, o cientista volta percorrer uma trajetória semelhante à apresentada, obviamente agora num nível mais elevado.

macrométodo do ensino4. O macrométodo do ensino

Vamos agora tentar caracterizar o macrométodo correspondente ao ensino com o auxílio da figura 3, ao lado. Vimos que o cientista escolhe o que vai estudar e, após essa escolha, ao estudar aquilo a que se propôs, ele pode ou não ser afetado pela intuição, iniciando assim a sua trajetória pela espiral científica. O ensino já é um pouco diferente. No ensino não há essa liberdade de escolha. O ensino começa pela aceitação de um tema curricular. O indivíduo pode ter a liberdade de escolha no vestibular; mas, após seu ingresso na universidade, essa liberdade torna-se bastante restrita. Nem o professor tem muita escolha, posto que ele é obrigado a seguir um currículo. Podemos até questionar o grau de exigência a que o professor está submetido, porém, queiramos ou não queiramos, algum tipo de currículo deve ser obedecido. Não teria cabimento, numa faculdade de medicina, o professor ensinar seus alunos a construírem um viaduto; quando muito, que ele os ensine a construir uma ponte de safena, mas um viaduto creio que seria um tema a ser discutido numa faculdade de engenharia. Portanto, não pode haver aí uma liberdade total, como era o caso observado no setor pesquisa. A ciência não tem fronteiras, e o cientista pode optar por sua área de estudo, conquanto seja mais fácil que ele se restrinja à sua área de atuação; o ensino, ao contrário, é limitado por um currículo, exige uma restrição.

macrométodo do ensino 2Colocado o tema curricular, o ensino desenvolve-se por mais duas fases gerais: estudos e/ou debates do tema colocado, e a síntese. Quando muito, nós podemos questionar a maneira de se percorrer a circunferência da figura 4, à esquerda (o macrométodo do ensino). Assim, alguns criticam o ensino de receita de bolo, também chamado ensino de cópia, no qual o aluno copia o que o professor fala ou escreve (fase 1), passa a limpo e/ou estuda em casa (fase 2) e tenta reproduzir na prova a matéria assim ministrada (fase 3). Acredito ser esta a maneira errada de se ensinar, mas não deixa de ser uma forma de se percorrer o círculo apresentado. Pode-se percorrer o círculo através da simulação de uma pesquisa, caso em que, com frequência, se confunde o processo com o que se convencionou chamar educação pela pesquisa (4), e que na realidade deveria ser chamado ensino pela experimentação (simulada ou não).

É comum a suposição, muitas vezes errônea, de que numa aula de laboratório o aluno está aprendendo a fazer pesquisa. É até possível que esteja; mas, na grande maioria dos casos, ele está participando de uma aula laboratorial que não se diferencia em nada da clássica aula de receita de bolo na qual, quando muito, ele está aprendendo a manusear aparelhos sofisticados. Ao repetir uma experiência realizada por Faraday há 150 anos, não podemos, em sã consciência, dizer que o aluno está fazendo pesquisa. Toda pesquisa, como vimos, inicia-se pela intuição, o que está faltando nesse processo.

O bom professor é aquele que consegue não educar pela pesquisa, mas sim, ensinar pela simulação, na qual o professor provoca insights no aluno. Via de regra, o professor sabe, de antemão, e por experiência própria, o tipo de insight que o aluno vai ter, visto ser um insight provocado. O professor então aproveita-se desta situação e deixa, ou até mesmo estimula o aluno a que reinvente a roda. E isso é importante, posto que explora ou desenvolve a criatividade latente no aluno. Com isso, o professor ensina o aluno a pesquisar, o que é bem diferente de educar pela pesquisa. E essa atividade processa-se na área de ensino, e não na área de pesquisa.

O que pode eventualmente acontecer, é que, quando o professor está adotando esse método, o aluno realmente tenha um insight que não aquele provocado pelo professor. Nesse caso, a fim de não comprometer o seu trabalho —que além de ser limitado por um currículo, é dirigido a uma classe, e não a um único aluno— o professor deve levar esse aluno ao setor de pesquisa. Com efeito, os demais alunos não tiveram esse tipo de insight e, consequentemente, não vão se aproveitar deste insight. Visto desta forma, o aluno deve ser levado ao setor de pesquisa quando estiver preparado para isso, e a motivação para tal deve ser cultivada na sala de aula, ou seja, no setor de ensino.

A quem cabe orientar esse aluno levado ao centro de pesquisa? Se na instituição em que tal ocorreu, o ensino estiver efetivamente integrado à pesquisa, o orientador poderá ser o próprio professor que flagrou o insight; ou então alguém indicado por este professor que, por trabalhar no centro de pesquisa, e estar bem entrosado com seus colegas, conhece alguém melhor para executar essa tarefa. Na minha opinião, o erro fundamental de nossas pós-graduações, é o aluno escolher o orientador antes do insight; e, via de regra, quem tem o insight é o orientador, e não o pós-graduando. Em conclusão: o pós-graduando não faz pesquisa; ele defende tese, é doutor, e não é pesquisador, e isso acaba trazendo consequências sérias para o país, onde se tem 50.000 indivíduos que ganham como cientistas e não sei se temos 5.000 que produzem ciência. Por quê? Por que eles são formados nesse estilo: o orientador tem o insight, e o aluno vai mexer nos equipamentos de laboratório.

macrométodo da extensão5. O macrométodo da extensão

Podemos agora concluir a tríade apresentando o macrométodo da extensão (figura 5). Em concordância com o que mostra a figura ao lado, a universidade entra em contato com os problemas da comunidade, promove estudos em busca da solução destes problemas e propõe a —e/ou, até mesmo, participa da— resolução dos problemas. Percebam que, da forma como o macrométodo está exposto, qualquer secretaria do governo estaria sujeita a essas mesmas diretrizes, mas isto não invalida a extensão como inerente à universidade.

Um centro de pesquisa também não precisa estar vinculado a uma universidade, e poderíamos citar, dentre muitos, o Instituto Butantã. Com efeito, existem centros de pesquisa isolados, existem instituições de ensino isoladas, e existem áreas onde se pratica a extensão, como por exemplo, uma secretaria de governo, ou um hospital não ligado a universidades. Isso é extensão, apenas que exercida fora da universidade, ainda que não se aplique, nesses casos, a denominação extensão; e aí talvez resida a dificuldade do termo, posto que, para cada área de atuação, ou para cada entidade prestadora de serviço, se dê um nome diferente. No caso de uma secretaria do governo, diz-se que está a mesma exercendo uma atividade político-social; no caso do hospital está se exercendo uma atividade de assistência à saúde. Para cada setor e/ou instituição, que não uma universidade, há um nome específico que não extensão a caracterizar tal atividade profissional que, ocorrendo na universidade, justifica o termo extensão universitária. Um hospital escola é um órgão de extensão da faculdade de medicina; o Centro de Psicologia Aplicada é um órgão de extensão do nosso curso de Psicologia; o Centro de Assistência Jurídica é um órgão de extensão do nosso curso de Direito. Estes órgãos vivem resolvendo problemas da comunidade e, em troca, revelam-se úteis para os setores de ensino e de pesquisa da universidade. E os três setores convergem, desta forma, para a finalidade única e última da universidade, qual seja, colaborar para a formação de cidadãos úteis para a sociedade.

6. Conclusão

A figura 6 mostra como ensino, pesquisa e extensão se interligam. Podemos então percorrer os sistemas, no sentido já apresentado anteriormente, acrescentando-se agora as interligações, evidenciando como se processa, ou como deveria se processar, a integração entre os setores assinalados. Percebam a independência funcional dos três setores. Cada um existe por si só. Todos são autônomos e independentes, conquanto interligados, e, portanto, indissociados em virtude, única e exclusivamente, de estarem inseridos num contexto intimamente relacionado ao objetivo primordial da universidade. Da mesma forma que não se concebe a existência de uma faculdade de medicina sem um hospital escola, também não se deve conceber uma universidade sem um setor de extensão instalado, ativo e com finalidades outras que não apenas servir de complemento aos demais setores. (5)

ensino-pesquisa-extensão

O que representa o plano ensino-pesquisa-extensão mostrado na figura 6? Eu diria que representa, de forma esquemática, o cérebro da universidade; e, como cérebro, temos o lado direito e o lado esquerdo. Aquela flecha, entre os campos ensino e pesquisa (1), convida-nos à reflexão: Como evoluir do ensino para a pesquisa? Quais são os elementos básicos a integrarem o ensino à pesquisa? Nada mais são que a dúvida, a incerteza, e, acima de tudo, a intuição. Ou seja, por acreditarmos que somos capazes de esclarecer as nossas dúvidas, por acreditarmos que podemos dissipar as nossas incertezas, e por acreditarmos na nossa intuição como fonte de criação de novos conhecimentos, é que podemos evoluir do ensino para a pesquisa. Este é, então, o lado intuitivo da universidade, o cérebro direito unificado através daquela pequena flecha (1). E vejam: eu me utilizei por três vezes da expressão por acreditarmos. Ou seja, esta pequena flecha representa a : a fé em nós mesmos, a significar que acreditamos em nossa evolução no sentido de adquirirmos novos conhecimentos.

No lado esquerdo do esquema, a representar o cérebro da universidade, encontramos a interligação ensino-extensão. Um aluno, após ter bem assimilado um determinado tema curricular —chegando então à síntese do conhecimento proposto por seu professor— ao se sentir seguro, ou com a certeza desta sabedoria —e de que, portanto, adquiriu um certo potencial— acaba por perceber que pode exercer esse potencial para o bem de sua comunidade. Entre a percepção e a ação há toda uma disposição para o agir, representada pela pequena flecha (2) situada à esquerda, disposição associada a algo tão transcendental quanto a fé acima citada. A flecha que une os campos ora em discussão, ou seja, a ponte a unir ensino a extensão, representa o amor ao próximo.

Passemos agora à conexão entre os hemisférios cerebrais da universidade. O que une a extensão à pesquisa? Extensão, como podemos perceber, retrata o campo profissionalizante da universidade, e pesquisa refere-se ao campo de produção de conhecimentos. O que une extensão à pesquisa nada mais é que a comunicação, a palavra.

O que falta, então para a universidade integrar o ensino à pesquisa e à extensão. O que é necessário para isso? Simplesmente , amor e palavra. É isso o que falta para a nossa universidade, e é isso o que está faltando para o mundo. É este o exemplo que auniversidade deve dar ao mundo: promover a restauração da fé, disseminar o amor ao próximo e resgatar o poder da palavra, a fim de que todos os membros da comunidade possam adquirir o status de cidadãos do mundo.

Grupos de EstudosPara terminar eu vou expor rapidamente, com o auxílio da figura 7 ao lado, como está planejado o setor de grupos de estudos do Centro de Pesquisa da USJT (6). O setor comporta três tipos de grupos de estudos: 1) os grupos de criatividade, GC, destinados a cultivar o surgimento de insights; 2) os grupos de pesquisa, GP, que correspondem à fase em que seus componentes estão efetivamente realizando pesquisas; 3) e os grupos de difusão, GD, onde seus componentes, de posse de conhecimentos adquiridos em etapas anteriores, optam por desenvolver projetos extensionistas. O inventor da xerox, por exemplo, teve um insight enquanto aluno universitário; desenvolveu o produto deste insight, enquanto pesquisador, e a seguir optou pela carreira de empresário de seu invento. O sub-setor grupo de difusão seria também, como o exemplo dá a entender, o local apropriado para a universidade incubar empresas, função esta também relacionada ao conceito de extensão universitária.

* * * * * *

Referências:

(*) Palestra proferida no II Simpósio Multidisciplinar "A Integração Universidade-Comunidade", Mesa Redonda "O Princípio da Indissociabilidade Ensino-Pesquisa-Extensão", realizada em 9 de outubro de 1996, USJT. Voltar

(**) Pró-reitor Comunitário da USJT. Voltar

[1] Vide à p. 158 (Carta de Intenções do CP da USJT). Voltar

[2] BOTOME, S.P., Pesquisa alienada e ensino alienante -- O equívoco da extensão universitária, Editora Vozes, Petrópolis, 1996. Voltar

[3] MARTINS FILHO, J., A Unicamp aos 30 anos, FSP de 9/10/96, Seção Opinião-Tendências/Debates, p. 1-3. O grifo é meu [N. A.]. Voltar

[4] DEMO, P., Educar pela pesquisa, Editora Autores Associados, Campinas, SP, 1996. Voltar

[5] Os quatro parágrafos seguintes, foram pronunciados, pelo autor do texto, por ocasião da Sessão de Encerramento (11/10/96) do II Simpósio Multidisciplinar da USJT. Voltar

[6] Vide Considerações sobre os Grupos de Estudo (GE) do Centro de Pesquisa da USJT in Informativo CP, Integração II(5):128-9, 1996. Voltar

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